{"id":10155,"date":"2023-12-20T09:23:33","date_gmt":"2023-12-20T09:23:33","guid":{"rendered":"https:\/\/eurodefense.pt\/?p=10155"},"modified":"2023-12-20T09:26:18","modified_gmt":"2023-12-20T09:26:18","slug":"as-armas-do-terrorismo-os-engenhos-explosivos-improvisados-ied","status":"publish","type":"post","link":"https:\/\/eurodefense.pt\/as-armas-do-terrorismo-os-engenhos-explosivos-improvisados-ied\/","title":{"rendered":"As armas do terrorismo: Os engenhos explosivos improvisados (IED)"},"content":{"rendered":"\n
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Descarregar pdf<\/a><\/mark><\/strong><\/td><\/tr><\/tbody><\/table><\/figure>\n\n\n\n

Em uma opera\u00e7\u00e3o de contraterrorismo da INTERPOL, um jovem \u00e9 detido pela posse de uma grande quantidade de produtos qu\u00edmicos, incluindo acetona, \u00e1gua oxigenada e lix\u00edvia, bem como instrumentos de cozinha e instru\u00e7\u00f5es para a constru\u00e7\u00e3o de bombas. Uma agente daquela Organiza\u00e7\u00e3o sintetiza o caso: \u201cWhat was he doing? A homemade explosive device (HME). Where did he get the materials? He got them from the same places that we buy our bread and milk for our children. There are people out there shopping for explosives to kill in the name of extremism<\/strong>\u201d.<\/p>\n\n\n\n

Esta opera\u00e7\u00e3o n\u00e3o aconteceu, mas poderia ter acontecido.<\/em><\/strong> Retratada em uma curta-metragem<\/a> da INTERPOL – vencedora da medalha de ouro da nona edi\u00e7\u00e3o do Festival Cannes Corporate Media & TV Awards em 2018<\/a> \u2013 constitui uma representa\u00e7\u00e3o fict\u00edcia de um potencial caso real. O filme faz parte do projeto Litmus<\/a>, uma iniciativa da INTERPOL que visa preparar as autoridades para detetar, investigar e perseguir todos aqueles envolvidos no planeamento e prepara\u00e7\u00e3o de um ataque terrorista com qu\u00edmicos ou explosivos. Em 2021, as autoridades da Dinamarca e Noruega detiveram diversos suspeitos, ligados \u00e0 extrema-direita e ao jihadismo, em casos semelhantes.<\/p>\n\n\n\n

De forma introdut\u00f3ria, este texto visa explorar um dos m\u00e9todos mais utilizados para a perpetra\u00e7\u00e3o de ataques terroristas: o uso de engenhos explosivos improvisados<\/strong>, tamb\u00e9m conhecidos por \u201cIED\u201d na terminologia inglesa (Improvised Explosive Device<\/em>). Este texto divide-se em tr\u00eas partes – conceito; evolu\u00e7\u00e3o hist\u00f3rica e resposta.<\/p>\n\n\n\n

1. Conceito<\/strong><\/p>\n\n\n\n

Os grupos terroristas utilizam uma variedade de t\u00e1ticas, m\u00e9todos e procedimentos para perpetrarem viol\u00eancia, cuja utiliza\u00e7\u00e3o varia consoante os objetivos do grupo, os recursos dispon\u00edveis, ambiente operacional, entre outros fatores. Identificadas na literatura como \u201cterrorist tactics, techniques and procedures<\/em>\u201d (TTP), as mais comuns incluem a utiliza\u00e7\u00e3o de ataques \u00e0 bomba; bombistas-suicidas; assassinatos; armas de fogo; sequestros e engenhos explosivos improvisados (IED).<\/strong> De acordo com o Global Terrorism Index<\/em> (2023<\/a>), a n\u00edvel global o recurso aos ataques com explosivos \u00e9 o m\u00e9todo mais utilizado, seguido do uso de armas de fogo.<\/p>\n\n\n\n

Os engenhos explosivos improvisados (IED)<\/strong> s\u00e3o dispositivos fabricados com recurso a produtos letais, nocivos, qu\u00edmicos, pirot\u00e9cnicos ou incendi\u00e1rios que t\u00eam como objetivo destruir ou incapacitar um determinado alvo, civil ou militar. Dito de outro modo, por norma referem-se a bombas caseiras que s\u00e3o frequentemente utilizadas por terroristas, criminosos, insurgentes, ou outros atores n\u00e3o-estatais, geralmente contra uma for\u00e7a militar.<\/p>\n\n\n\n

N\u00e3o obstante, os IEDs tamb\u00e9m s\u00e3o utilizados por Estados<\/strong> em conflitos armados, tal como se tem verificado no caso da guerra na Ucr\u00e2nia<\/strong>, quer por parte das for\u00e7as ucranianas (ex. uso<\/a> de drones com explosivos), quer russas (ex. utiliza\u00e7\u00e3o<\/a> de ve\u00edculos blindados carregados com IEDs). Em 2022, a intelligence<\/a> brit\u00e2nica alertou para o uso intensivo de IEDs por parte da R\u00fassia contra civis. A utiliza\u00e7\u00e3o de IEDs em conflitos armados \u00e9 legal, mas est\u00e1 sujeita \u00e0s regras do Direito Internacional Humanit\u00e1rio, sendo estritamente proibido<\/a> atingir civis ou us\u00e1-los de forma indiscriminada.<\/p>\n\n\n\n

Os IED podem ser fabricados com material militar, mas s\u00e3o sobretudo concebidos atrav\u00e9s de materiais comerciais, de f\u00e1cil acesso. Neste \u00faltimo caso, s\u00e3o designados por \u201chomemade explosives<\/em>\u201d (HME). Se os IED forem constru\u00eddos com o prop\u00f3sito de difundir subst\u00e2ncias NRBQ (nucleares, radiol\u00f3gicas, biol\u00f3gicas ou qu\u00edmicas) tomam a designa\u00e7\u00e3o de \u201cdirty bombs<\/em>\u201d (um caso exemplificado em uma outra curta-metragem<\/a> da INTERPOL). Os IED podem assumir m\u00faltiplas formas, desde uma pequena bomba ou um cocktail molotov<\/em>, a um dispositivo explosivo de maior complexidade (ver figura 1). Em resultado da sua configura\u00e7\u00e3o variada, os IED podem ser transportados ou escondidos de diversas maneiras, seja em um ve\u00edculo, indiv\u00edduo (colete-suicida) ou animal, entre outros.<\/p>\n\n\n\n

Figura 1: Exemplos de Engenhos Explosivos Improvisados (IED)<\/strong><\/p>\n\n\n

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(da esquerda para a direita):<\/strong> Bomba caseira (pipe bomb<\/em>); Carro-bomba (fertilizer truck bomb<\/em>); Cocktail Molotov.
Fonte:<\/strong> Exemplos referidos pelo United Nations Office on Drugs and Crime (
UNODC<\/a>).<\/p>\n\n\n\n

2. Evolu\u00e7\u00e3o hist\u00f3rica<\/strong><\/p>\n\n\n\n

Historicamente o conceito de \u201cengenho explosivo improvisado\u201d (IED) surgiu apenas na d\u00e9cada de 1970, tendo sido cunhado pelo Ex\u00e9rcito Brit\u00e2nico em resultado das a\u00e7\u00f5es do IRA na Irlanda do Norte. O conceito foi posteriormente popularizado com a guerra no Iraque em 2003.<\/p>\n\n\n\n

Segundo a ONU<\/a>, \u00e9 a utiliza\u00e7\u00e3o ilegal de IEDs por parte de atores n\u00e3o-estais<\/strong>, tais como terroristas, insurgentes ou atores solit\u00e1rios (incluindo \u201crogue individuals<\/em>\u201d), que suscita especial preocupa\u00e7\u00e3o e alarme, sendo uma \u201camea\u00e7a em crescimento\u201d<\/strong>. O aumento da procura e do seu uso deve-se \u00e0 conjuga\u00e7\u00e3o de diversos fatores: (1) simplicidade na constru\u00e7\u00e3o (facilitada pelas informa\u00e7\u00f5es dispon\u00edveis online); (2) acessibilidade e baixo custo dos componentes; (3) m\u00e9todo alternativo ou complementar \u00e0s armas ligeiras em pa\u00edses com fortes regulamenta\u00e7\u00f5es nesse \u00e2mbito; (4) possibilidade de destrui\u00e7\u00e3o significativa com poucos recursos.<\/p>\n\n\n\n

Existem diversos<\/strong> exemplos da utiliza\u00e7\u00e3o de IEDs<\/strong> por parte deste tipo de atores. Um dos casos mais citados \u00e9 o ataque do Hezbollah contra o quartel do Corpo de Fuzileiros Navais norte-americano em Beirute, em 1983<\/a>. O ataque, que em 2023 assinala o 40\u00ba anivers\u00e1rio<\/a>, vitimou 220 fuzileiros bem como 58 paraquedistas franceses, em resultado de um bombista-suicida que se fez explodir junto de um outro edif\u00edcio militar. Destacam-se outros casos relevantes como o ataque bombista em Oklahoma (1995) ou os ataques terroristas em Madrid (2004) e Londres (2005). No \u00e2mbito da Uni\u00e3o Europeia<\/strong> os relat\u00f3rios da EUROPOL sobre as tend\u00eancias do terrorismo neste espa\u00e7o regional (TE-SAT) evidenciam que a utiliza\u00e7\u00e3o de engenhos explosivos improvisados (HME, sobretudo) s\u00e3o o m\u00e9todo preferido dos terroristas de matriz islamista, embora tamb\u00e9m sejam utilizados por grupos afetos \u00e0 extrema-direita.<\/p>\n\n\n\n

Para a ONU<\/a>, os ataques com IEDs s\u00e3o uma \u201camea\u00e7a global\u201d,<\/strong> tendo-se tornado a arma preferencial de grupos armados n\u00e3o estatais em v\u00e1rios conflitos: anualmente<\/a>, \u201cmatam e ferem mais pessoas do que qualquer outro tipo de arma, exceto armas de fogo\u201d. De acordo com a NATO<\/a>, s\u00e3o tamb\u00e9m \u201cuma das principais causas de baixas militares em conflitos armados\u201d. Note-se que utiliza\u00e7\u00e3o de IEDs foram um dos principais m\u00e9todos<\/a> utilizados nas guerras no Iraque e Afeganist\u00e3o: s\u00f3 no ano de 2015<\/a> os ataques com IED foram a segunda maior causa de baixas civis no Afeganist\u00e3o. As estimativas globais revelam um impacto significativo dos ataques com IEDs<\/strong>, destacando-se os danos infligidos em civis, for\u00e7as militares e as consequ\u00eancias negativas nos processos pol\u00edticos e de ajuda humanit\u00e1ria.<\/p>\n\n\n\n

3. Resposta<\/strong><\/p>\n\n\n\n

Prevenir e combater a utiliza\u00e7\u00e3o de engenhos explosivos improvisados \u00e9 uma prioridade tanto para as Na\u00e7\u00f5es Unidas como para a NATO.<\/p>\n\n\n\n

No \u00e2mbito da ONU<\/strong>, a United Nations Mine Action Service (UNMAS<\/a>) desempenha um papel fulcral desde 1997 na inativa\u00e7\u00e3o e elimina\u00e7\u00e3o de IEDs, minas, e outros dispositivos explosivos em conflitos armados.<\/p>\n\n\n\n

No \u00e2mbito da NATO<\/strong>, destaca-se o Plano de A\u00e7\u00e3o de combate a esta amea\u00e7a (2013<\/a>) e a C-IED Doctrine (2018<\/a>), que estipula os fundamentos nesta \u00e1rea, incluindo orienta\u00e7\u00f5es estrat\u00e9gicas e pol\u00edticas. Atualmente, a inativa\u00e7\u00e3o de IEDs em conflitos armados ainda \u00e9 uma atividade manual, por norma realizada por equipas designadas \u201cEOD\u201d – Explosive Ordnance Disposal<\/em>. Em Portugal<\/strong>, a PSP e a GNR bem como todos os ramos das For\u00e7as Armadas – Marinha, Ex\u00e9rcito e For\u00e7a A\u00e9rea – disp\u00f5em de elementos especializados na inativa\u00e7\u00e3o de explosivos. Recentemente, tal como pode ser visto neste v\u00eddeo<\/a>, um grupo de cientistas e especialistas da NATO desenvolveu um mecanismo tecnol\u00f3gico, com recurso a drones, para ajudar os militares nesta tarefa, o que tem permitido alargar a \u00e1rea de atua\u00e7\u00e3o bem como salvar vidas.<\/p>\n\n\n\n

A Alian\u00e7a Atl\u00e2ntica disp\u00f5e tamb\u00e9m de um Centro dedicado ao combate de IEDs – Counter-Improvised Explosive Devices Centre of Excellence<\/em> (C-IED COE<\/a>). Inaugurado em 2010 e localizado em Espanha, na cidade de Madrid, o C-IED COE tem-se centrado em produzir um conjunto de conhecimentos especializados a fim de proteger as for\u00e7as aliadas e reduzir os riscos inerentes em um teatro de opera\u00e7\u00f5es. O Centro conta com mais de 40 especialistas e 12 estados-membros, do qual Portugal<\/strong> faz parte.<\/p>\n\n\n\n

Conclus\u00e3o<\/strong><\/p>\n\n\n\n

Os engenhos explosivos improvisados (IED) s\u00e3o dispositivos utilizados por atores estatais e n\u00e3o estatais. \u00c9 a sua utiliza\u00e7\u00e3o por parte de grupos terroristas e outros que tem suscitado maior preocupa\u00e7\u00e3o por parte de autoridades e organiza\u00e7\u00f5es internacionais, pois continuam a ser instrumentos atrativos para a perpetra\u00e7\u00e3o de viol\u00eancia. A preven\u00e7\u00e3o e combate \u00e9 uma prioridade, na qual a sociedade civil pode ter um papel importante a desempenhar, nomeadamente na identifica\u00e7\u00e3o de determinados ind\u00edcios.<\/p>\n\n\n\n


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20 de dezembro de 2023<\/p>\n\n\n\n

Joana Ara\u00fajo Lopes<\/strong> possui um Doutoramento em \u201cHist\u00f3ria, Estudos de Seguran\u00e7a e Defesa\u201d pelo Instituto Universit\u00e1rio de Lisboa e Academia Militar. Em 2023 defendeu uma tese com financiamento da FCT sobre contraterrorismo em Portugal e Espanha no contexto da Uni\u00e3o Europeia (2004-2020). \u00c9 Mestre em Ci\u00eancia Pol\u00edtica e Rela\u00e7\u00f5es Internacionais pela Universidade NOVA de Lisboa (2017). Os seus principais interesses de investiga\u00e7\u00e3o incidem sobre a seguran\u00e7a internacional, o terrorismo, o contraterrorismo, a radicaliza\u00e7\u00e3o, o extremismo violento e a diplomacia.<\/p>\n\n\n\n

https:\/\/ciencia.iscte-iul.pt\/authors\/joana-araujo-lopes\/cv<\/a><\/p>\n\n\n\n

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NOTA<\/strong>:<\/mark><\/p>\n\n\n\n