{"id":156,"date":"2016-10-24T08:52:50","date_gmt":"2016-10-24T08:52:50","guid":{"rendered":"https:\/\/eurodefense.pt\/?p=156"},"modified":"2021-02-11T17:58:18","modified_gmt":"2021-02-11T17:58:18","slug":"hillary-clinton-donald-trump-relacoes-transatlanticas-e-novos-desafios-aos-europeus","status":"publish","type":"post","link":"https:\/\/eurodefense.pt\/hillary-clinton-donald-trump-relacoes-transatlanticas-e-novos-desafios-aos-europeus\/","title":{"rendered":"Hillary Clinton\/Donald Trump \u2013 Rela\u00e7\u00f5es transatl\u00e2nticas e novos desafios aos europeus"},"content":{"rendered":"\n
Apesar de hoje, felizmente, todas as sondagens darem como certa a vit\u00f3ria de Hillary Clinton, julgo que n\u00e3o se devem esquecer as posi\u00e7\u00f5es assumidas pelos candidatos durante a campanha eleitoral. Donald Trump n\u00e3o ganhar\u00e1, como indicam as sondagens, mas nem por isso as suas posi\u00e7\u00f5es e declara\u00e7\u00f5es populistas e nacionalistas deixam de merecer a concord\u00e2ncia de muitos milh\u00f5es de americanos que o seguem, e at\u00e9 de muitos que nunca nele votariam.<\/p>\n\n\n\n
Na minha interven\u00e7\u00e3o falarei sobre as posi\u00e7\u00f5es dos candidatos relativamente a duas quest\u00f5es que interessam especialmente a Portugal e \u00e0 Europa: por um lado, as declara\u00e7\u00f5es sobre a NATO e o papel dos EUA na seguran\u00e7a europeia; e, por outro lado, os importantes desafios que a nova presid\u00eancia e a nova administra\u00e7\u00e3o americana colocam aos europeus.<\/p>\n\n\n\n
Em primeiro lugar, o que nos dizem os candidatos acerca do papel dos EUA na Alian\u00e7a Atl\u00e2ntica?<\/p>\n\n\n\n
Numa entrevista concedida ao The New York Times, na v\u00e9spera da sua nomea\u00e7\u00e3o presidencial pelos republicanos, no dia 20 de julho \u2013 entrevista que foi exaustivamente analisada por think-tanks e comentadores europeus e americanos \u2013 Donald Trump voltou a sublinhar a linha dura que assumiu durante a campanha.<\/p>\n\n\n\n
Nessa entrevista ele chegou a dizer que abandonaria a globaliza\u00e7\u00e3o a favor do nacionalismo americano, al\u00e9m de descrever como iria for\u00e7ar os aliados a assumirem finalmente os custos da defesa que os Estados Unidos t\u00eam suportado ao longo de d\u00e9cadas, apelando a uma maior participa\u00e7\u00e3o nas despesas militares (burden-sharing).<\/em><\/p>\n\n\n\n Sabemos que tem sido recorrente esta insist\u00eancia dos EUA para que os aliados europeus reforcem as suas capacidades militares, alocando, pelo menos, 2% do PIB aos or\u00e7amentos da defesa, de acordo com os crit\u00e9rios de partilha de encargos assumidos no fim da guerra fria.<\/p>\n\n\n\n At\u00e9 agora apenas 5 dos pa\u00edses europeus membros da NATO satisfazem este requisito (UK, Gr\u00e9cia, Polonia, Fran\u00e7a e Est\u00f3nia). Este crit\u00e9rio tem mesmo sido posto em causa, por aqueles que consideram que a meta de 2% do PIB \u00e9 insuficiente e que a partilha de risco (risk sharing<\/em>) deveria ser tamb\u00e9m um elemento necess\u00e1rio para avaliar as justas contribui\u00e7\u00f5es dos aliados para a seguran\u00e7a coletiva.<\/p>\n\n\n\n Mas Donald Trump n\u00e3o se limitou a dizer que \u201ca NATO \u00e9 obsoleta e extremamente cara para os EUA\u201d, como fez da quest\u00e3o do financiamento da NATO e da ajuda militar americana um importante tema de campanha. Ainda ontem repetiu que os estados Unidos n\u00e3o podem continuar a suportar a defesa de uma lista de pa\u00edses, onde incluiu a Alemanha.<\/p>\n\n\n\n Por outro lado, ignora ostensivamente as recentes posi\u00e7\u00f5es agressivas da R\u00fassia que amea\u00e7am seriamente os acordos com os Estados Unidos.<\/p>\n\n\n\n Moscovo suspende acordos nucleares e desloca m\u00edsseis<\/strong><\/p>\n\n\n\n Como \u00e9 sabido, nas \u00faltimas semanas, tem havido uma constante deteriora\u00e7\u00e3o nas rela\u00e7\u00f5es entre o Ocidente e a R\u00fassia:<\/p>\n\n\n\n Sem falar na S\u00edria e no seu fort\u00edssimo potencial de conflito entre os EUA e a R\u00fassia.<\/p>\n\n\n\n Importa acrescentar que, segundo alguns especialistas, a suspens\u00e3o dos acordos nucleares pode p\u00f4r em causa os tratados de desarmamento e n\u00e3o prolifera\u00e7\u00e3o das armas nucleares, o que \u00e9 grav\u00edssimo e acontece pela primeira vez depois da guerra fria.<\/p>\n\n\n\n Mesmo assim, \u00e0 pergunta sobre o que faria se a R\u00fassia atacasse os pa\u00edses aliados do B\u00e1ltico, Trump n\u00e3o hesitou em responder que s\u00f3 decidiria o auxilio americano depois de verificar \u201cse os pa\u00edses atacados tinham cumprido as suas obriga\u00e7\u00f5es para com os EUA\u201d.<\/p>\n\n\n\n Ou seja, para ele a Am\u00e9rica poderia n\u00e3o honrar o artigo V do tratado do Atl\u00e2ntico Norte que constitui desde sempre a pedra angular da Alian\u00e7a Atl\u00e2ntica, segundo o qual um ataque a um Estado membro \u00e9 um ataque contra todos.<\/p>\n\n\n\n Estas como muitas outras declara\u00e7\u00f5es foram repudiadas pelos pr\u00f3prios republicanos e do lado europeu poucos acreditam que Trump fosse capaz de prosseguir com estas ideias, se fosse eleito.<\/p>\n\n\n\n No entanto, na opini\u00e3o de v\u00e1rios comentadores europeus, mesmo que Trump n\u00e3o ganhe, algum dano j\u00e1 foi feito, porque as suas declara\u00e7\u00f5es t\u00eam impacto sobre as expectativas das pessoas, tanto na opini\u00e3o p\u00fablica americana como junto dos europeus, e prejudicam objetivamente a rela\u00e7\u00e3o transatl\u00e2ntica, que \u00e9 baseada na confian\u00e7a e no pressuposto de que temos uma ampla comunh\u00e3o de interesses e valores.<\/p>\n\n\n\n Por outro lado, n\u00e3o podemos ignorar que esta vis\u00e3o de Donald Trump sobre as rela\u00e7\u00f5es com os aliados europeus corresponde tamb\u00e9m a convic\u00e7\u00f5es de longa data de muitos americanos.<\/p>\n\n\n\n Hillary Clinton, por seu lado, reagiu a estas declara\u00e7\u00f5es, considerou-as repugnantes e disse que elas s\u00f3 encorajariam Moscovo. Elogiou o papel da NATO e disse que o empenhamento dos Estados Unidos na Alian\u00e7a Atl\u00e2ntica serve os interesses da Am\u00e9rica, devendo, por outro lado, ser refor\u00e7adas as rela\u00e7\u00f5es com os pa\u00edses europeus com vista \u00e0 cria\u00e7\u00e3o de um grande bloco de oposi\u00e7\u00e3o \u00e0 amea\u00e7a russa.<\/p>\n\n\n\n N\u00e3o deixou de recordar que os EUA tamb\u00e9m invocaram o artigo V ap\u00f3s os ataques terroristas de 11 de setembro de 2001 e que os aliados da NATO responderam prontamente, do mesmo modo que os americanos devem estar preparados para prestar assist\u00eancia a qualquer aliado.<\/p>\n\n\n\n Relut\u00e2ncia europeia \u2013 opini\u00f5es e governos n\u00e3o convergem<\/strong><\/p>\n\n\n\n Um segundo ponto que gostaria de sublinhar \u00e9 relativo \u00e0 forma como a Europa, ou melhor os governos europeus, est\u00e3o a encarar os desafios que as elei\u00e7\u00f5es americanas nos colocam.<\/p>\n\n\n\n Para isso socorro-me de um estudo que acaba de ser divulgado pelo European Center for Foreign Relations, contendo as respostas a um inqu\u00e9rito lan\u00e7ado por este importante think-tank europeu em cada um dos 28 Estados-Membros sobre as elei\u00e7\u00f5es presidenciais americanas. \u00c9 curioso observar que o titulo que deram a este estudo \u2013 \u201cFear and loathing on the road to the US elections\u201d \u2013 d\u00e1-nos a ideia de que os inquiridos ter\u00e3o revelado medo e repugn\u00e2ncia pelo caminho que as elei\u00e7\u00f5es estavam a levar.<\/p>\n\n\n\n Queriam saber quais as perce\u00e7\u00f5es dos governos, das oposi\u00e7\u00f5es e da opini\u00e3o p\u00fablica em geral sobre os desafios que a nova presid\u00eancia poder\u00e1 colocar aos respetivos pa\u00edses e se, em geral, a Europa estava pronta para enfrentar as consequ\u00eancias de uma nova administra\u00e7\u00e3o dos EUA ap\u00f3s o mandato de Barack Obama.<\/p>\n\n\n\n As respostas recolhidas mostram uma grande variedade de pontos de vista, sobre estas mat\u00e9rias, em toda a Europa. Mas um tema emerge fortemente a recolher a quase unanimidade. Os europeus, particularmente os que atualmente est\u00e3o no governo, anseiam pela continuidade e estabilidade das rela\u00e7\u00f5es transatl\u00e2nticas.<\/p>\n\n\n\n Os EUA continuam a ser vistos como o mais poderoso garante da seguran\u00e7a europeia. Por isso, os europeus manifestam claramente o forte desejo de que os EUA reforcem o seu papel como produtor e fornecedor da seguran\u00e7a da Europa.<\/p>\n\n\n\n Hillary Clinton \u00e9, por isso, naturalmente considerada como o candidato favorito porque representa a estabilidade e a consist\u00eancia das rela\u00e7\u00f5es, repudiando as posi\u00e7\u00f5es de Trump em mat\u00e9ria de politica externa. De entre os 28, apenas um, a Hungria, destoa manifestando a sua confian\u00e7a em Donald Trump\u2026. O que tamb\u00e9m n\u00e3o nos deve surpreender. Les bons esprits se rencontrent\u2026.<\/em><\/p>\n\n\n\n Tamb\u00e9m as rela\u00e7\u00f5es comerciais e econ\u00f3micas transatl\u00e2nticas s\u00e3o citadas por muitos Estados-Membros como um fator importante de preocupa\u00e7\u00e3o dos europeus, havendo um amplo apoio \u00e0 r\u00e1pida conclus\u00e3o das negocia\u00e7\u00f5es do TTIP (transtlantic trade and investment partnership). Um acordo que est\u00e1 a ser negociado h\u00e1 mais de dois anos e continua cheio de incertezas. Com uma vit\u00f3ria do lado republicano, os europeus temem que seria mais dif\u00edcil um fecho feliz desta parceria.<\/p>\n\n\n\n O Inqu\u00e9rito demonstra, finalmente, que, de uma maneira geral, os europeus manifestam uma profunda relut\u00e2ncia em acreditar que a ret\u00f3rica atual sobre a redu\u00e7\u00e3o do papel dos EUA no exterior se venha a traduzir em efeito real sobre a pol\u00edtica externa dos EUA.<\/p>\n\n\n\n Opini\u00e3o contr\u00e1ria \u00e9 a de muitos comentadores norte-americanos europeus cientes de que, independentemente do resultado das elei\u00e7\u00f5es, as tend\u00eancias pol\u00edticas nos Estados Unidos e as tend\u00eancias geopol\u00edticas no exterior apontam para que o seu papel no mundo ter\u00e1 de mudar face \u00e0 inevit\u00e1vel revis\u00e3o das suas prioridades.<\/p>\n\n\n\n \u00c8 sua convic\u00e7\u00e3o que os americanos aceitariam que nesta revis\u00e3o das prioridades externas dos EUA se inclua um refor\u00e7o das suas alian\u00e7as tradicionais e sobretudo da comunidade transatl\u00e2ntica. Exigir\u00e3o, por\u00e9m, que os aliados europeus assumam maiores responsabilidades, tanto na sua pr\u00f3pria seguran\u00e7a e defesa, como na sua contribui\u00e7\u00e3o para a seguran\u00e7a internacional.<\/p>\n\n\n\n Conv\u00e9m, por\u00e9m, n\u00e3o esquecer que os interesses estrat\u00e9gicos priorit\u00e1rios dos Estados Unidos da Am\u00e9rica est\u00e3o a deslocar-se para a regi\u00e3o \u00c1sia-Pac\u00edfico, onde a China, cujo poder naval tem aumentado significativamente, constitui um risco crescente para a estabilidade internacional e para a seguran\u00e7a da navega\u00e7\u00e3o mar\u00edtima, sobretudo nos disputados Mares do Sul da China.<\/p>\n\n\n\n Segundo alguns autores, a quest\u00e3o fundamental a que o pr\u00f3ximo Presidente dos EUA ter\u00e1 que responder, na \u00e1rea do politica externa, ser\u00e1 a de saber como lidar com a ascens\u00e3o da China como pot\u00eancia econ\u00f3mica global e pot\u00eancia militar, o que se torna no maior desafio estrat\u00e9gico dos EUA, al\u00e9m de ser um dos fatores mais importantes na constru\u00e7\u00e3o de uma nova ordem internacional no s\u00e9culo XXI.<\/p>\n\n\n\n <\/p>\n\n\n\n Ant\u00f3nio Figueiredo Lopes<\/strong><\/strong> Interven\u00e7\u00e3o na Confer\u00eancia sobre as Elei\u00e7\u00f5es Americanas organizada, em Lisboa, pelo Instituto Benjamin Franklin, no Gr\u00e9mio Liter\u00e1rio, em 20 de outubro de 2016.<\/em><\/p>\n","protected":false},"excerpt":{"rendered":" Apesar de hoje, felizmente, todas as sondagens darem como certa a vit\u00f3ria de Hillary Clinton, julgo que n\u00e3o se devem esquecer as posi\u00e7\u00f5es assumidas pelos candidatos durante a campanha eleitoral. 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Presidente da Dire\u00e7\u00e3o<\/em><\/p>\n\n\n\n