{"id":186,"date":"2017-04-12T09:44:35","date_gmt":"2017-04-12T09:44:35","guid":{"rendered":"https:\/\/eurodefense.pt\/?p=186"},"modified":"2021-02-11T18:21:13","modified_gmt":"2021-02-11T18:21:13","slug":"a-politica-externa-da-nova-administracao-americana-oportunidade-para-as-industrias-europeias-de-defesa-uma-opiniao","status":"publish","type":"post","link":"https:\/\/eurodefense.pt\/a-politica-externa-da-nova-administracao-americana-oportunidade-para-as-industrias-europeias-de-defesa-uma-opiniao\/","title":{"rendered":"A pol\u00edtica externa da nova Administra\u00e7\u00e3o americana: oportunidade para as ind\u00fastrias europeias de Defesa? \u2013 Uma opini\u00e3o"},"content":{"rendered":"\n

As declara\u00e7\u00f5es sobre uma hipot\u00e9tica divida financeira de muitos Estados membros da NATO relativamente \u00e0 Organiza\u00e7\u00e3o (e \u00e0 Defesa Militar em geral), a qual se reflectiria num desproporcionado contributo por parte dos EUA para o funcionamento da Alian\u00e7a e para a Defesa europeia, t\u00eam sido recorrentes, por parte do Presidente Donald Trump.<\/p>\n\n\n\n

Ainda recentemente, por ocasi\u00e3o da visita a Washington da Chanceler alem\u00e3, Angela Merkel, o assunto foi abordado publicamente na confer\u00eancia de imprensa bilateral, mantendo o Presidente Trump a opini\u00e3o que j\u00e1 se lhe conhecia.<\/p>\n\n\n\n

Alguns dados apontam efectivamente para uma maior comparticipa\u00e7\u00e3o dos EUA no funcionamento da NATO, relativamente ao que acontecia nos tempos da Guerra Fria. Assim, aparentemente, muitos Aliados ter\u00e3o deixado \u201cdeslizar\u201d o seu contributo para a defesa colectiva, eventualmente por raz\u00f5es de pol\u00edtica interna, o que n\u00e3o agradar\u00e1, pensamos, a muitos american taxpayers<\/em>.<\/p>\n\n\n\n

Diga-se que o Governo alem\u00e3o, logo ap\u00f3s a visita acima referida, comunicou publicamente a posi\u00e7\u00e3o segundo a qual o seu contributo para a defesa e seguran\u00e7a internacionais n\u00e3o se esgota na NATO, mas inclui os gastos com miss\u00f5es e funcionamento da ONU, interven\u00e7\u00f5es da Uni\u00e3o Europeia, ac\u00e7\u00f5es humanit\u00e1rias uni e multilaterais, etc. (a este prop\u00f3sito, ignoramos se a Alemanha inclui as despesas com for\u00e7as de seguran\u00e7a interna no c\u00f4mputo das despesas de Defesa).<\/p>\n\n\n\n

Estamos em crer que a vis\u00e3o alem\u00e3 poder\u00e1 n\u00e3o ter muito acolhimento na nova Washington, dado que, provavelmente, vingar\u00e1 por l\u00e1 o argumento que, quando as coisas correm mal na regi\u00e3o euro-atl\u00e2ntica, \u00e9 para a NATO que todos os olhares se voltam, dada a sua testada organiza\u00e7\u00e3o de comandos e for\u00e7as militares, e n\u00e3o para quaisquer outras organiza\u00e7\u00f5es, por muito merit\u00f3rias que sejam.<\/p>\n\n\n\n

Assim, e permitindo-nos tomar como v\u00e1lida a hip\u00f3tese referida no primeiro par\u00e1grafo, vaticinamos que muitos Estados europeus v\u00e3o ver-se \u201cobrigados\u201d a refor\u00e7ar os seus or\u00e7amentos de Defesa, aumentando as despesas militares, incluindo atrav\u00e9s da aquisi\u00e7\u00e3o de armamento e equipamentos de Defesa.<\/p>\n\n\n\n

\u00c9 neste \u00e2mbito que o presente texto, sem quaisquer ambi\u00e7\u00f5es acad\u00e9micas, se permite expressar uma opini\u00e3o.<\/p>\n\n\n\n

Aquisi\u00e7\u00f5es europeias e americanas<\/strong><\/p>\n\n\n\n

Historicamente, \u00e9 um facto que no p\u00f3s-2\u00aa Guerra Mundial, os armamentos e equipamentos de defesa de origem americana rearmaram as reconstitu\u00eddas for\u00e7as militares europeias, atrav\u00e9s dos programas Military Assistance Program<\/em> ou Mutual Defense Assistance Pact<\/em>. Para usar um exemplo da aeron\u00e1utica, nas d\u00e9cadas de 50 e 60 do s\u00e9culo passado, os stocks<\/em> americanos \u201cinundaram\u201d as for\u00e7as a\u00e9reas europeias ocidentais com a sucess\u00e3o de ca\u00e7as F-84\/F-86\/F-100\/F-104\/F-4 e, mais tarde, F-16, semelhantemente repetida para outros tipos de aeronaves (Portugal n\u00e3o operou os F-100, F-104 e F-4 dada a ocorr\u00eancia do conflito africano). Foi apenas (magra) excep\u00e7\u00e3o a este cen\u00e1rio a produ\u00e7\u00e3o brit\u00e2nica de aeronaves, a qual ainda conseguiu alguns sucessos europeus com o ca\u00e7a Hunter<\/em>, por coincid\u00eancia em pa\u00edses libertados da ocupa\u00e7\u00e3o nazi pelas for\u00e7as brit\u00e2nicas. Claro est\u00e1 que na sua defesa nacional os brit\u00e2nicos empregaram aeronaves pr\u00f3prias (Lightning<\/em>, Britannia<\/em>, p.ex.\u00ba), mas nem mesmo os s\u00fabditos de Sua Majestade conseguiram escapar ao \u201ccaudal\u201d americano (F-4, C-130, etc.) muitas vezes apenas ap\u00f3s ferozes pol\u00e9micas dom\u00e9sticas.<\/p>\n\n\n\n

Outra excep\u00e7\u00e3o not\u00e1vel tem sido o caso franc\u00eas, o qual, apos a recep\u00e7\u00e3o inicial de in\u00fameros equipamentos americanos, conseguiu evoluir estrat\u00e9gica e tecnologicamente para uma alargada autonomia em material de defesa, com uma ou outra excep\u00e7\u00e3o (KC-135 de reabastecimento no ar ou avi\u00f5es-radar E-2 do porta-avi\u00f5es Charles de Gaulle<\/em>).<\/p>\n\n\n\n

No entanto, a partir dos anos 60 do s\u00e9culo passado, com o desenvolvimento tecnol\u00f3gico e industrial de defesa, come\u00e7ou a desenhar-se um cen\u00e1rio no qual as for\u00e7as a\u00e9reas europeias da NATO poderiam beneficia de programas multinacionais europeus de aeronaves, estando n\u00f3s em crer que o primeiro grande passo ter\u00e1 sido dado pelo cons\u00f3rcio franco-alem\u00e3o do avi\u00e3o Transall<\/em> (Transport Alliance<\/em>), visando complementar e ou substituir o avi\u00e3o de concep\u00e7\u00e3o e fabrico americano C-130. Nesta sequ\u00eancia, veio a surgir mais tarde o desenvolvimento do ca\u00e7a-bombardeiro trinacional Panavia 2000-Tornado<\/em>, sucedido pelo actual programa multinacional europeu Eurofighter Typhoon.<\/em><\/p>\n\n\n\n

Tais desenvolvimentos n\u00e3o eliminaram, todavia, o recurso extensivo e financeiramente vultuoso \u00e0 fonte americana de materiais e equipamentos, muitas vezes menos vis\u00edvel por se tratar, n\u00e3o de grandes plataformas de armas, mas de m\u00faltiplos artigos e componentes n\u00e3o facilmente notados nas demonstra\u00e7\u00f5es e desfiles militares.<\/p>\n\n\n\n

Assim, poder\u00e1 dizer-se que, se \u00e9 certo que os aliados americanos t\u00eam \u201cpegado na conta\u201d no \u00e2mbito da NATO, tamb\u00e9m \u00e9 certo que t\u00eam beneficiado de avultados proveitos relativos a diversos programas de aquisi\u00e7\u00e3o de material por parte dos aliados europeus, sobretudo se se considerarem custos de ciclo de vida.<\/p>\n\n\n\n

O fornecedor americano<\/strong><\/p>\n\n\n\n

Como muitos gestores log\u00edsticos sabem, existem duas maneiras de adquirir material de defesa aos EUA: as Direct Commercial Sales<\/em> (DCS) e as Foreign Military Sales<\/em> (FMS). Na primeira, estabelece-se um contrato directo entre um fabricante americano e um Governo estrangeiro (apesar desta liga\u00e7\u00e3o directa, o Governo americano tem sempre que aprovar a venda do material, atrav\u00e9s do Office of Defense Trade Controls<\/em> do Bureau of Political-Military Affairs<\/em> do Department of State<\/em>, para assegurar o respeito dos aspectos de controlo de exporta\u00e7\u00f5es). Na modalidade FMS, o contrato \u00e9 feito entre o Governo estrangeiro e o Governo americano, sendo tamb\u00e9m o Office of Defense Trade Controls<\/em> respons\u00e1vel pela garantia do respeito da legisla\u00e7\u00e3o de controlo de exporta\u00e7\u00f5es (em ambos os casos, os potenciais neg\u00f3cios s\u00e3o comunicados ao Congresso). Os FMS Cases<\/em> s\u00e3o geridos no \u00e2mbito do Department of Defense<\/em> e dos ramos militares (Navy<\/em>, Army<\/em>, Air<\/em> Force<\/em>).<\/p>\n\n\n\n

N\u00e3o se vai aqui escalpelizar as vantagens e inconvenientes das DCS versus<\/em> as FMS, nem se vai igualmente detalhar os pormenores destas \u00faltimas, como as Letter of Offer and Acceptance<\/em> e outros documentos, os quais s\u00e3o redigidos segundo os estritos termos definidos pela parte americana, sem hip\u00f3tese de altera\u00e7\u00e3o pela parte estrangeira.<\/p>\n\n\n\n

Numa nota pessoal, cabe dizer que o autor destas linhas tem alguma experiencia em assuntos FMS (n\u00e3o muita, reconhece-se) mas dos contactos realizados h\u00e1 alguns anos ficou a impress\u00e3o de uma \u201cm\u00e1quina\u201d extremamente eficiente do lado americano, englobando programme managers<\/em> (funcion\u00e1rios civis) muito profissionais e sempre sorridentes, mas que est\u00e3o l\u00e1 para defender os interesses dos j\u00e1 referidos american taxpayers<\/em> e n\u00e3o quaisquer outros. E muito bem, diga-se! Compete aos seus hom\u00f3logos n\u00e3o-americanos fazerem o mesmo pela sua parte\u2026embora possa ser question\u00e1vel qual o real \u201cpoder de alavanca\u201d que o (pequeno) cliente estrangeiro tem, face \u00e0 tal \u201cm\u00e1quina americana\u201d, quando surgem aumentos imprevistos de pre\u00e7os, por exemplo\u2026<\/p>\n\n\n\n

Os fornecedores europeus<\/strong><\/p>\n\n\n\n

Tanto quanto o autor sabe, n\u00e3o existe um mecanismo europeu semelhante ao FMS. O que ocorre s\u00e3o contratos entre fabricantes e Governos estrangeiros, sempre sob o controlo (e, muitas vezes, promo\u00e7\u00e3o activa, at\u00e9 ao n\u00edvel politico) do Governo do pa\u00eds fabricante. As rela\u00e7\u00f5es de aquisi\u00e7\u00e3o e sustenta\u00e7\u00e3o s\u00e3o, assim, sempre entre cliente (ramo militar do pa\u00eds comprador) e fornecedor (fabricante), com eventual apoio pontual do ramo militar correspondente do pa\u00eds fornecedor, existindo por vezes interven\u00e7\u00e3o de empresas intermedi\u00e1rias.<\/p>\n\n\n\n

Assinalamos, por raz\u00f5es de completamento, que \u00e9 poss\u00edvel adquirir ainda material militar por uma terceira via, nomeadamente atrav\u00e9s de \u00f3rg\u00e3os log\u00edsticos da NATO, ficando estes como intermedi\u00e1rios e gestores do programa entre o Governo comprador e os fornecedores, europeus ou americanos. Por exemplo em Portugal recorreu-se a este m\u00e9todo, no in\u00edcio da d\u00e9cada de 2000, para determinado material a\u00e9reo, programa esse j\u00e1 terminado.<\/p>\n\n\n\n

Como se referiu, no continente europeu a influ\u00eancia americana em material militar tem vindo a esbater-se lentamente, quer no \u00e2mbito terrestre (carros de combate de origem alem\u00e3, p.ex.\u00ba) quer ao n\u00edvel naval (navios de origem brit\u00e2nica, alem\u00e3, francesa ou holandesa) ou mesmo aeron\u00e1utico (o j\u00e1 referido Eurofighter Typhoon<\/em> ou o transporte A400M Atlas<\/em>). Isto apesar da continuada exist\u00eancia de multimilion\u00e1rios programas euro-americanos, como \u00e9 o caso do avi\u00e3o F-35, a equipar quatro pa\u00edses europeus ocidentais, no imediato.<\/p>\n\n\n\n

Confessamos n\u00e3o ter neste momento dados num\u00e9ricos para comparar a qualidade do apoio log\u00edstico americano versus<\/em> o europeu, em termos de prazos de entrega, quer de material novo, quer de material enviado aos fabricantes para repara\u00e7\u00e3o (turn-around times<\/em>), quer no cumprimento dos pre\u00e7os acordados inicialmente entre as partes, ou ainda no que respeita a restri\u00e7\u00f5es de acesso \u00e0s tecnologias de base (seria um interessante trabalho de pesquisa a realizar, se n\u00e3o est\u00e1 j\u00e1 feito). Bem sabemos que a decis\u00e3o de aquisi\u00e7\u00e3o de material militar de elevado custo obedece a v\u00e1rios crit\u00e9rios, eventualmente at\u00e9 de ordem da pol\u00edtica externa, para al\u00e9m de outros de ordem financeira, de performance<\/em> operacional e de sustenta\u00e7\u00e3o log\u00edstica.<\/p>\n\n\n\n

Assim, e \u00e9 este o ponto onde se pretendia chegar, assumindo que ser\u00e1 imperioso que os Aliados europeus da NATO aumentem as suas contribui\u00e7\u00f5es para a NATO, e naturalmente as respectivas aquisi\u00e7\u00f5es militares, porque n\u00e3o faz\u00ea-lo com especial aten\u00e7\u00e3o \u00e0s industrias europeias de defesa, permitindo que pelo menos uma parte das verbas despendidas permane\u00e7am em solo europeu, sendo certo que n\u00e3o ser\u00e1 poss\u00edvel (e seria desej\u00e1vel?) eliminar por completo o canal log\u00edstico americano?<\/p>\n\n\n\n

Assim, cumprir-se-ia a vontade da nova Administra\u00e7\u00e3o americana, aumentando o burden sharing<\/em> europeu, mas com fuga m\u00ednima de verbas e de compet\u00eancias tecnol\u00f3gicas e industriais para fora da Europa, reinvestindo aqueles valores nas economias europeias.<\/p>\n\n\n\n

Para tal, a ind\u00fastria de defesa europeia tem de se manter actualizada em investiga\u00e7\u00e3o e desenvolvimento tecnol\u00f3gico e industrial (mantendo a adequada seguran\u00e7a de informa\u00e7\u00e3o industrial), de modo a que os seus produtos n\u00e3o caiam para um n\u00edvel inferior aos da concorr\u00eancia externa, sob pena de eventuais or\u00e7amentos refor\u00e7ados virem a adquirir o material militar adequado\u2026para o passado e n\u00e3o para o futuro.<\/p>\n\n\n\n

Cabe aos pequenos pa\u00edses procurar participar com as suas ind\u00fastrias nos grandes programas europeus, sendo certo que por vezes se conseguem criar nichos de excel\u00eancia com potencial interesse para os grandes actores da base tecnol\u00f3gica e industrial de defesa europeia.<\/p>\n\n\n\n

\"esquadrilhaf-16forcaaereaportuguesa\"Um exemplo poderia ser o novo projecto de aeronave de combate europeia, o Future Combat Air System (FCAS), numa perspectiva de substitui\u00e7\u00e3o dos actuais avi\u00f5es F-16MLU. Tal projecto est\u00e1 ainda numa fase muito inicial de discuss\u00e3o, entre a Airbus Defence and Space e a Alemanha, com Fran\u00e7a, Espanha e Reino Unido, este j\u00e1 sob o enquadramento do \u00abBrexit\u00bb, tamb\u00e9m a realizar estudos. Seria interessante que desde j\u00e1 se recolhesse a informa\u00e7\u00e3o dispon\u00edvel de forma a que,  quer o potencial utilizador nacional, quer a ind\u00fastria de Defesa portuguesa se posicionassem para participar em tal projecto.<\/p>\n\n\n\n

Pensamos que a Eurodefense-Portugal poder\u00e1 contribuir como plataforma de informa\u00e7\u00e3o\/divulga\u00e7\u00e3o para este importante objectivo.<\/p>\n\n\n\n

Jos\u00e9 Mira<\/strong><\/strong>
Associado<\/p>\n","protected":false},"excerpt":{"rendered":"

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