{"id":3181,"date":"2020-10-02T21:04:42","date_gmt":"2020-10-02T21:04:42","guid":{"rendered":"https:\/\/eurodefense.pt\/?p=3181"},"modified":"2023-02-20T18:52:00","modified_gmt":"2023-02-20T18:52:00","slug":"dilemas-e-paradoxos-da-seguranca-nacional","status":"publish","type":"post","link":"https:\/\/eurodefense.pt\/dilemas-e-paradoxos-da-seguranca-nacional\/","title":{"rendered":"Dilemas e Paradoxos da Seguran\u00e7a Nacional"},"content":{"rendered":"\n

O ambiente de seguran\u00e7a deste primeiro quartel do s\u00e9c. XXI difere substancialmente do que esteve na g\u00e9nese da arquitetura de seguran\u00e7a internacional do p\u00f3s-Segunda Guerra-Mundial, sendo marcado pelo acelerado desenvolvimento tecnol\u00f3gico, pela revolu\u00e7\u00e3o digital e progressiva desmaterializa\u00e7\u00e3o dos processos, tamb\u00e9m nos dom\u00ednios da defesa e seguran\u00e7a.<\/p>\n\n\n\n

A contra\u00e7\u00e3o das dimens\u00f5es espa\u00e7o-tempo e o atual contexto de hiperinforma\u00e7\u00e3o t\u00eam efeitos nos crit\u00e9rios do acesso \u00e0 informa\u00e7\u00e3o atrav\u00e9s da mir\u00edade de plataformas de comunica\u00e7\u00e3o com alcance global. Entramos no dom\u00ednio da economia da aten\u00e7\u00e3o, no ecossistema das gigantes tecnol\u00f3gicas onde empresas como a Google, a Apple, o Facebook e a Amazon (as designadas GAFA) disp\u00f5em da capacidade para nos monitorizarem em perman\u00eancia, acumulando dados que voluntariamente disponibilizamos, reunindo um poder de controlo e influ\u00eancia que empresas como a Cambridge Analytica utilizam de forma vantajosa.<\/p>\n\n\n\n

Entramos na era das guerras h\u00edbridas, que visam manter o n\u00edvel da agress\u00e3o abaixo de um patamar justificativo da resposta militar e que s\u00e3o a express\u00e3o b\u00e9lica da complexidade do per\u00edodo p\u00f3s-moderno. Embora a finalidade da guerra \u2013 destruir o inimigo ou a sua vontade de combater, continue t\u00e3o atual no presente como no tempo de Sun Tzu, o \u00faltimo destes prop\u00f3sitos est\u00e1 cada vez mais delegado em atores n\u00e3o militares.<\/p>\n\n\n\n

Nunca como no presente o invent\u00e1rio b\u00e9lico foi t\u00e3o preciso, potente e diversificado, tendo-se alargado at\u00e9 aos dom\u00ednios aeroespacial e do ciberespa\u00e7o. Em contrapartida, formas assim\u00e9tricas de condu\u00e7\u00e3o da guerra como o terrorismo, os ciberataques, o recurso a insurgentes e \u00e0 guerra de informa\u00e7\u00e3o, conjugada com a\u00e7\u00f5es convencionais, diplom\u00e1ticas e econ\u00f3micas, fazem apelo a formas de resposta que extravasam os m\u00e9todos convencionais. A anexa\u00e7\u00e3o da pen\u00ednsula da Crimeia pela R\u00fassia, em 2014, \u00e9 um exemplo paradigm\u00e1tico da complexidade associada \u00e0s opera\u00e7\u00f5es militares atuais.<\/p>\n\n\n\n

Por outro lado, tecnologias disruptivas em acelerado processo de desenvolvimento como os m\u00edsseis hipers\u00f3nicos, a militariza\u00e7\u00e3o do espa\u00e7o e a aplica\u00e7\u00e3o da Intelig\u00eancia Artificial no dom\u00ednio militar, poder\u00e3o ditar uma altera\u00e7\u00e3o no atual quadro de hegemonia dos EUA, ditando a insolv\u00eancia da sua estrutura de proje\u00e7\u00e3o de poder e rede global de bases militares.<\/p>\n\n\n\n

O diagn\u00f3stico do ambiente de seguran\u00e7a recomenda uma ideia estrat\u00e9gica para Portugal. O nosso pa\u00eds esteve na g\u00e9nese da abertura do mundo \u00e0 modernidade, sendo precursor da presen\u00e7a europeia em tr\u00eas continentes, porque soubemos galvanizar o conhecimento tecnol\u00f3gico e cient\u00edfico que nos garantiu vantagens competitivas nos dom\u00ednios da cartografia, da navega\u00e7\u00e3o mar\u00edtima, artilharia e constru\u00e7\u00e3o naval, tendo ainda desenvolvido uma ideia estrat\u00e9gica de controlo dos oceanos.<\/p>\n\n\n\n

Para sermos intervenientes no processo de transforma\u00e7\u00e3o em curso, num contexto internacional onde o centro de gravidade geopol\u00edtico e geoecon\u00f3mico est\u00e1 em desloca\u00e7\u00e3o para a \u00c1sia, onde fomos os primeiros europeus a chegar por via mar\u00edtima e soubemos desenvolver uma rela\u00e7\u00e3o frutuosa com a China, importa compreender que o papel da defesa e seguran\u00e7a n\u00e3o se pode subsumir \u00e0 vigil\u00e2ncia do espa\u00e7o mar\u00edtimo interterritorial, at\u00e9 porque n\u00e3o se vislumbram a\u00ed amea\u00e7as.   <\/p>\n\n\n\n

Os desafios que se colocam \u00e0 defesa e seguran\u00e7a est\u00e3o em linha com os que Portugal enfrenta num plano mais vasto da edifica\u00e7\u00e3o de uma sociedade com elevados padr\u00f5es de desenvolvimento humano. Trata-se de um esfor\u00e7o que no atual contexto de crises m\u00faltiplas, da desglobaliza\u00e7\u00e3o \u00e0 desocidentaliza\u00e7\u00e3o, do unilateralismo de Trump \u00e0s convuls\u00f5es sociais, ambientais e securit\u00e1rias no Sul global, s\u00f3 se apresenta resol\u00favel no quadro de um contexto regional integrador \u2013 a Uni\u00e3o Europeia. A op\u00e7\u00e3o europeia confere-nos a escala necess\u00e1ria e um relevo adicional em outros f\u00f3runs colmatando a exiguidade geogr\u00e1fica e populacional.<\/p>\n\n\n\n

No momento em que a UE procura afirmar a sua autonomia estrat\u00e9gica, tendo criado linhas de financiamento para a economia da defesa, com especial destaque para o fundo europeu de defesa, com sete mil milh\u00f5es no pr\u00f3ximo quadro financeiro plurianual (2021-2027), \u00e9 tempo de tamb\u00e9m no plano da defesa e seguran\u00e7a aderirmos \u00e0 UE.<\/p>\n\n\n\n

Este \u00e9 o momento para integrar redes industriais europeias, com todas as vantagens que da\u00ed adv\u00eam para o esfor\u00e7o de moderniza\u00e7\u00e3o e reindustrializa\u00e7\u00e3o que constitui uma das linhas de orienta\u00e7\u00e3o estrat\u00e9gica do plano de recupera\u00e7\u00e3o de Ant\u00f3nio Costa Silva, na sua estrat\u00e9gia para a recupera\u00e7\u00e3o econ\u00f3mica p\u00f3s-pandemia.<\/p>\n\n\n\n

Encarar a defesa e seguran\u00e7a como elemento de moderniza\u00e7\u00e3o tecnol\u00f3gica e cient\u00edfica, atento o facto de que as ind\u00fastrias de defesa, em boa medida, assentam em tecnologias de duplo uso, \u00e9 perceber que os benefici\u00e1rios n\u00e3o s\u00e3o apenas as for\u00e7as armadas, mas a economia em geral, por via da cria\u00e7\u00e3o de emprego qualificado, riqueza e desenvolvimento industrial.<\/p>\n\n\n\n

Faz sentido que o governo tenha adquirido \u00e0 ind\u00fastria nacional drones para a vigil\u00e2ncia dos fogos rurais, com raio de a\u00e7\u00e3o de 100 Km, privilegiando a base tecnol\u00f3gica e industrial do nosso pa\u00eds e dando um sinal claro \u00e0s empresas de que a ind\u00fastria nacional est\u00e1 no radar das escolhas quando o Estado faz aquisi\u00e7\u00f5es. O facto de termos capacidade para produzir equipamentos com este n\u00edvel de sofistica\u00e7\u00e3o atesta que a ind\u00fastria nacional tem vindo a percorrer um caminho promissor.<\/p>\n\n\n\n

Mais importante do que saber se os drones come\u00e7aram a operar a 31 de agosto, como apontou a for\u00e7a a\u00e9rea, ou dois meses antes como indicado pelo MDN, se v\u00e3o ser pilotados por militares da Marinha, do Ex\u00e9rcito ou da For\u00e7a A\u00e9rea, ramo que tem no espa\u00e7o a\u00e9reo o seu ambiente operacional e cujo crit\u00e9rio ter\u00e1 pesado para a n\u00e3o atribui\u00e7\u00e3o destes meios ao seu principal benefici\u00e1rio, a GNR, \u00e9 estarmos perante tecnologia nacional.<\/p>\n\n\n\n

Pensar a arquitetura do sistema de seguran\u00e7a nacional \u00e0 medida dos desafios do atual ambiente de seguran\u00e7a, acarreta que a economia da defesa seja considerada como vari\u00e1vel de relevo na participa\u00e7\u00e3o em projetos colaborativos com outros players<\/em> da UE, atentos os efeitos de escala na dimens\u00e3o do mercado e no upgrade<\/em> tecnol\u00f3gico associado. A presen\u00e7a do presidente executivo da ag\u00eancia europeia de defesa e do diretor-geral da ind\u00fastria de defesa e espa\u00e7o em Lisboa, no pr\u00f3ximo dia 10 de novembro, nas jornadas sobre economia da defesa, \u00e9 um sinal auspicioso e, sobretudo, um reconhecimento da din\u00e2mica que a ind\u00fastria nacional tem vindo a tomar. Neste dom\u00ednio, estamos muito melhor do que frequentemente julgamos.<\/p>\n\n\n\n


\n\n\n\n

02 de outubro de 2020<\/p>\n\n\n\n

\"\"<\/figure><\/div>\n\n\n\n

Agostinho Costa<\/strong>
Vice-Presidente da<\/em> Dire\u00e7\u00e3o<\/p>\n\n\n\n

(Artigo de Opini\u00e3o publicado no jornal Di\u00e1rio de Not\u00edcias<\/strong>, de 29 de setembro de 2020:<\/em><\/p>\n\n\n\n

https:\/\/www.dn.pt\/opiniao\/opiniao-dn\/convidados\/dilemas-e-paradoxos-da-seguranca-nacional-12767587.html<\/span><\/a><\/em><\/p>\n","protected":false},"excerpt":{"rendered":"

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