{"id":605,"date":"2020-01-20T21:06:20","date_gmt":"2020-01-20T21:06:20","guid":{"rendered":"https:\/\/eurodefense.pt\/?p=605"},"modified":"2023-02-20T18:52:38","modified_gmt":"2023-02-20T18:52:38","slug":"mesa-redonda-eurodefense-jovem-nesiscte-o-que-sera-do-reino-unido-e-da-uniao-europeia-apos-o-brexit","status":"publish","type":"post","link":"https:\/\/eurodefense.pt\/mesa-redonda-eurodefense-jovem-nesiscte-o-que-sera-do-reino-unido-e-da-uniao-europeia-apos-o-brexit\/","title":{"rendered":"\u201cO que ser\u00e1 do Reino Unido e da Uni\u00e3o Europeia ap\u00f3s o Brexit\u201d"},"content":{"rendered":"\n

Mesa Redonda EuroDefense Jovem-NESISCTE<\/h4>\n\n\n\n

\u201cO Centro de Estudos EuroDefense-Portugal, membro da rede europeia de Associa\u00e7\u00f5es EURODEFENSE, tem como miss\u00e3o principal promover o debate sobre a pol\u00edtica europeia de Seguran\u00e7a e Defesa e suas implica\u00e7\u00f5es a n\u00edvel nacional\u201d<\/p>\n\n\n\n

Ant\u00f3nio Figueiredo Lopes, presidente da Dire\u00e7\u00e3o do EuroDefense-Portugal<\/em><\/p>\n\n\n\n

Nota de Abertura<\/h4>\n\n\n\n

No dia 28 de novembro de 2019, a EuroDefense Jovem-Portugal e o N\u00facleo Estudantes de Sociologia do ISCTE-IUL (NESISCTE) organizaram uma mesa redonda para analisar quest\u00f5es europeias atuais, convidando os alunos e todos os jovens em geral a debater as suas opini\u00f5es sobre a tem\u00e1tica do Brexit e consequentes implica\u00e7\u00f5es, nomeadamente na seguran\u00e7a e defesa europeia.
A parceria estabelecida com o NESISCTE envolveu o exerc\u00edcio m\u00fatuo de conce\u00e7\u00e3o de temas, de organiza\u00e7\u00e3o e de gest\u00e3o do evento, que levou ao acordo final sobre os pormenores de log\u00edstica e das tem\u00e1ticas a abordar que interessassem a ambos. Neste quadro de organiza\u00e7\u00e3o, a EuroDefense Jovem-Portugal contou com o precioso apoio dos estagi\u00e1rios do Instituto de Estudos Pol\u00edticos (IEP) da Universidade Cat\u00f3lica, que foram acompanhando e auxiliando no planeamento e execu\u00e7\u00e3o da atividade.
Esta atividade insere-se num dos objetivos da EuroDefense Jovem-Portugal que visa estabelecer contacto e envolver as universidades na organiza\u00e7\u00e3o de debates sobre as quest\u00f5es que ditar\u00e3o o nosso futuro e tenham relev\u00e2ncia no contexto acad\u00e9mico. Desta vez centramos a nossa aten\u00e7\u00e3o m\u00fatua nas quest\u00f5es do Brexit e da Seguran\u00e7a Europeia. Atividades como a realizada, em formato de mesa redonda e com uma participa\u00e7\u00e3o inclusiva, permitem n\u00e3o s\u00f3 trazer todos os pontos de vista para a discuss\u00e3o, mas sobretudo promover a consciencializa\u00e7\u00e3o sobre os desafios futuros com que a nossa gera\u00e7\u00e3o se ir\u00e1 debater, para a resolu\u00e7\u00e3o dos quais, s\u00f3 mais consciencializa\u00e7\u00e3o e mais cidadania s\u00e3o as respostas adequadas. Estes objetivos n\u00e3o se encontram apenas descritos no programa de trabalho dos jovens da EuroDefense-Portugal, mas s\u00e3o uma refer\u00eancia neste tipo das nossas atividades que visam estabelecer uma mais vasta e ampla rede de contactos e atividades.
O Brexit e particularmente a sua implementa\u00e7\u00e3o, ter\u00e3o sempre um impacto relevante na Uni\u00e3o Europeia e no Reino Unido, mas s\u00e3o acontecimentos que se podem tornar cr\u00edticos se n\u00e3o forem acautelados crit\u00e9rios de relacionamento futuro equilibrados e de boa colabora\u00e7\u00e3o entre vizinhos.
Esta tem\u00e1tica que influencia tanto a UE como o Reino Unido deve pois ser analisada minuciosamente n\u00e3o apenas nas suas carater\u00edsticas pol\u00edticas e econ\u00f3micas, mas em \u00e1reas sens\u00edveis como a Seguran\u00e7a e Defesa e sobretudo nos impactos m\u00fatuos, pelo que a pergunta de partida para o debate que se nos tornou mais evidente, foi: \u201co que ser\u00e1 do Reino Unido e da Uni\u00e3o Europeia ap\u00f3s o Brexit?\u201d.
Para responder a esta pergunta, procur\u00e1mos abordar as implica\u00e7\u00f5es pol\u00edtico-econ\u00f3micas na pessoa do Professor Doutor Nuno de Oliveira Pinto (CEI-IUL), que nos apresentou uma reflex\u00e3o desafiadora sobre as consequ\u00eancias \u00f3bvias e factuais para o futuro, resultantes do Brexit fazendo, nesse sentido, uma an\u00e1lise prospetiva dos acontecimentos. A sua excelente apresenta\u00e7\u00e3o n\u00e3o podia ter um melhor desfecho e complementaridade com o Professor Tenente-General Ant\u00f3nio Fontes Ramos (EuroDefense-Portugal) que nos elucidou de forma muito entusiasta e pragm\u00e1tica sobre as quest\u00f5es de seguran\u00e7a e defesa numa abordagem estrat\u00e9gica do continente europeu, no qual o Reino Unido mesmo ap\u00f3s a sua sa\u00edda da Uni\u00e3o Europeia, n\u00e3o pode ser alheio a estas problem\u00e1ticas.
A EuroDefense Jovem-Portugal v\u00ea nesta mesa redonda concretizados os seus des\u00edgnios e procura desenvolver mais atividades id\u00eanticas com regularidade. O relat\u00f3rio que se segue resume as interven\u00e7\u00f5es feitas pelos oradores convidados, procurando tornar-se num documento de valor acrescentado numa leitura breve e precisa das informa\u00e7\u00f5es aprendidas. Sempre com um objetivo priorit\u00e1rio de fazer chegar a informa\u00e7\u00e3o a todos os jovens.<\/p>\n\n\n\n

Redigido por: <\/em><\/p>\n\n\n\n

Miguel Carvalho Gomes<\/strong><\/strong>
Membro da EuroDefense Jovem-Portugal<\/p>\n\n\n\n

\"\"
Orador: Professor Doutor Nuno Gama Oliveira Pinto<\/em><\/figcaption><\/figure><\/div>\n\n\n\n
1\u00ba Painel \u2013 Brexit: uma an\u00e1lise prospetiva<\/h5>\n\n\n\n

Nos \u00faltimos anos, a Europa enfrentou diversos desafios, nomeadamente os causados pelo alargamento aos pa\u00edses de Leste. Esta altera\u00e7\u00e3o que marcou uma mudan\u00e7a do centro nevr\u00e1lgico europeu mais para leste, levou a que, como em todos os alargamentos do passado alguns pa\u00edses ganhassem mais do que outros, em diferentes medidas. Sabia-se de antem\u00e3o quais os pa\u00edses que seriam menos beneficiados com o alargamento, onde se inseria Portugal, porque acentuou o seu car\u00e1cter perif\u00e9rico em rela\u00e7\u00e3o ao centro da Europa, que beneficiou imenso com o alargamento aos novos mercados da Europa central e oriental.
Outros desafios \u00e0 Uni\u00e3o Europeia (UE) se sucederam, at\u00e9 chegarmos ao Brexit, que iremos aprofundar.<\/p>\n\n\n\n

O Brexit<\/h4>\n\n\n\n

O referendo sobre o Brexit realizou-se em junho de 2016, com uma diferen\u00e7a decis\u00f3ria muito pequena entre o sair e o ficar na UE, que foi favor\u00e1vel \u00e0 sa\u00edda; mas \u00e9 importante salientar as diferen\u00e7as verificadas nos resultados eleitorais, nomeadamente em Londres, na Esc\u00f3cia e na Irlanda do Norte, que votaram maioritariamente pela perman\u00eancia do RU como membro da UE.
A quest\u00e3o da Esc\u00f3cia \u00e9 quase caricata. No referendo para a independ\u00eancia da Esc\u00f3cia, uma das quest\u00f5es que provavelmente mais ter\u00e1 convencido os eleitores escoceses a votarem contra a separa\u00e7\u00e3o, foi o facto de que, se a Esc\u00f3cia sa\u00edsse do RU, sairia tamb\u00e9m da UE. Agora, neste caso, e perante os resultados do Brexit, correm o risco de sair por pertencerem ao RU. \u00c9 uma quest\u00e3o bastante complexa atendendo \u00e0s diferentes realidades regionais europeias (a Espanha provavelmente nunca iria concordar com a sa\u00edda da Esc\u00f3cia do RU e a sua ades\u00e3o \u00e0 UE, por causa do conflito independentista da Catalunha).
Quando abordamos a quest\u00e3o econ\u00f3mica do Brexit, \u00e9 quase imposs\u00edvel n\u00e3o v\u00ea-la tamb\u00e9m pelo seu impacto e pelas suas implica\u00e7\u00f5es de cariz geopol\u00edtico. O que est\u00e1 em causa \u00e9 muito mais do que a liberdade de circula\u00e7\u00e3o de pessoas, capitais ou mercadorias. Falamos tamb\u00e9m de outros problemas graves que importa resolver de uma forma cuidadosa e s\u00e9ria. Ele tem um impacto muito grande na vida das pessoas, nomeadamente na dos seus cidad\u00e3os.
O Brexit, que tem estado em cima da mesa desde 2016, teve um resultado eleitoral surpreendente para muitos. Provavelmente o Primeiro-Ministro da altura, David Cameron, que aceitou fazer o referendo pressionado pela ala mais \u00e0 direita do (seu) Partido Conservador, n\u00e3o esperava que o resultado fosse este. No entanto, este referendo trouxe efetivamente situa\u00e7\u00f5es muito dif\u00edceis de resolver: pol\u00edticas (como j\u00e1 referimos o referendo da Esc\u00f3cia) e econ\u00f3micas (a manuten\u00e7\u00e3o do mercado \u00fanico na Irlanda do Norte e a aplica\u00e7\u00e3o de taxas alfandeg\u00e1rias em diversos produtos).
No interior da UE existem v\u00e1rias dimens\u00f5es econ\u00f3micas, pol\u00edticas e sociais que se espelham na zona euro (19 EM), no espa\u00e7o Schengen (26 EM) e na Uni\u00e3o Europeia (28 EM).
Ficar na UE obriga a cumprir v\u00e1rios requisitos, nomeadamente do mercado \u00fanico (mercado aberto aos 28 Estados membros com cerca de 500 milh\u00f5es de pessoas), a liberdade de circula\u00e7\u00e3o sem qualquer restri\u00e7\u00e3o, independentemente de fazer parte do espa\u00e7o Schengen ou n\u00e3o (o controlo das fronteiras t\u00e3o utilizado na campanha eleitoral s\u00f3 \u00e9 poss\u00edvel saindo da UE). Claro que o RU se continuasse na UE podia controlar as suas fronteiras em rela\u00e7\u00e3o a cidad\u00e3os estrangeiros que n\u00e3o fa\u00e7am parte da UE. Mas n\u00e3o podia estabelecer restri\u00e7\u00f5es a quem se quer candidatar a cargos e profiss\u00f5es no RU (dentro da UE n\u00e3o existe trabalho brit\u00e2nico para cidad\u00e3os brit\u00e2nicos). Esta ideia custa por vezes a ser entendida devido \u00e0 desinforma\u00e7\u00e3o, ao populismo, e \u00e0 demagogia de muitos pol\u00edticos.<\/p>\n\n\n\n

Cen\u00e1rios poss\u00edveis do Brexit<\/h4>\n\n\n\n

Um cen\u00e1rio poss\u00edvel (pelo qual o RU parece n\u00e3o se interessar), \u00e9 integrar o Espa\u00e7o Econ\u00f3mico Europeu, no qual os pa\u00edses que lhe pertencem, utilizam e cumprem as mesmas prerrogativas que os outros EM, nomeadamente em mat\u00e9ria de mercado \u00fanico. Nesta situa\u00e7\u00e3o encontra-se a Isl\u00e2ndia, a Noruega e o Liechtenstein. Aceitam a liberdade de circula\u00e7\u00e3o de pessoas; aceitam tamb\u00e9m a jurisdi\u00e7\u00e3o do Tribunal Europeu; contribuem substancialmente para o or\u00e7amento europeu (o RU n\u00e3o est\u00e1 interessado em tal, ali\u00e1s a quest\u00e3o do or\u00e7amento foi muito criticada na campanha porque dizia-se que a contribui\u00e7\u00e3o do RU daria para construir v\u00e1rios hospitais por ano, o que \u00e9 mentira).O RU n\u00e3o est\u00e1 certamente interessado em nenhuma destas obriga\u00e7\u00f5es\/prerrogativas.
Sobram outras, que provavelmente tamb\u00e9m n\u00e3o interessam ao RU e \u00e0s suas empresas, que s\u00e3o os acordos bilaterais em v\u00e1rias \u00e1reas, como no caso da Su\u00ed\u00e7a; acordos de associa\u00e7\u00e3o, como acontece com a Ucr\u00e2nia; ou acordos de livre com\u00e9rcio como os exemplos recentes do Canad\u00e1 e da Coreia do Sul. Mas aqui importa ver efetivamente com que \u201cfato\u201d o RU se quer vestir no futuro. A situa\u00e7\u00e3o ideal para o RU seria uma solu\u00e7\u00e3o que n\u00e3o lhe exigisse contribuir para o or\u00e7amento, mas podendo continuar no mercado \u00fanico \u2013 mas essa solu\u00e7\u00e3o n\u00e3o \u00e9 poss\u00edvel. \u00c9 importante relembrar que foi s\u00f3 o Tratado de Lisboa que possibilitou, no art. 50\u00ba, a sa\u00edda de um pa\u00eds da UE. No RU alguns parecem pois querer uma solu\u00e7\u00e3o que n\u00e3o \u00e9 poss\u00edvel: o acesso ao mercado \u00fanico, mas sem a obriga\u00e7\u00e3o de aceitar a legisla\u00e7\u00e3o europeia, os imigrantes europeus e sem contribuir para o or\u00e7amento da Uni\u00e3o Europeia.
\u00c9 muito dif\u00edcil, no entanto, perspetivar que \u201cfato\u201d o RU quer efetivamente vestir. Quer vestir o \u201cfato\u201d de antiga pot\u00eancia colonial? Quer vestir o \u201cfato\u201d das prefer\u00eancias imperiais que tinha na altura do imp\u00e9rio brit\u00e2nico? Ou quer ter acesso ao mercado da UE e com isso poder tamb\u00e9m influenciar algumas das decis\u00f5es tomadas c\u00e1 dentro? A UE representa cerca de 1\/5 do com\u00e9rcio mundial, pelo que \u00e9 um gigante econ\u00f3mico, mas \u00e9 tamb\u00e9m um an\u00e3o pol\u00edtico. O Brexit \u00e9 um fator desestabilizador, com grandes repercuss\u00f5es, sem solu\u00e7\u00f5es j\u00e1 testadas, podendo trazer consequ\u00eancias negativas bastante profundas para todas as partes envolvidas.<\/p>\n\n\n\n

Redigido por: <\/em><\/p>\n\n\n\n

Guilherme Echeverri e Sara Canedo<\/em>s<\/strong><\/strong>
Membros da EuroDefense Jovem-Portugal<\/p>\n\n\n\n

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Orador: TGEN Ant\u00f3nio Fontes Ramos<\/em><\/figcaption><\/figure><\/div>\n\n\n\n
2\u00ba Painel \u2013 Impacto na Estrat\u00e9gia Global e Capacidades da Uni\u00e3o Europeia<\/h5>\n\n\n\n

O Contexto Estrat\u00e9gico Atual<\/p>\n\n\n\n

A Europa j\u00e1 teve muitas crises, que t\u00eam sido ultrapassadas. Mas a situa\u00e7\u00e3o atual requere decis\u00f5es e a\u00e7\u00f5es significativas.
O contexto atual complexo que se arrasta desde a \u201cgrande recess\u00e3o\u201d de 2007 tem, todavia, marcas atuais \u00edmpares e apresenta desafios muito complexos e escolhas dif\u00edceis e inadi\u00e1veis. E \u00e9 por isso que pressentimos este momento de crise sobre o que se passa na Europa, nomeadamente a prop\u00f3sito do Brexit, que acrescenta um novo patamar de dificuldade \u00e0 situa\u00e7\u00e3o atual. Este \u00e9 um processo complexo que causou uma divis\u00e3o profunda, como \u00e9 at\u00e9 vis\u00edvel no parlamento brit\u00e2nico.
As dificuldades atuais refletem-se em interven\u00e7\u00f5es de alguma forma dram\u00e1tica como a do Presidente Franc\u00eas Macron, que afirmou h\u00e1 pouco tempo que a NATO est\u00e1 em \u201cmorte cerebral\u201d, o que implica a necessidade de agir, pois estando a NATO nesse estado, a Europa encontra-se s\u00f3. De facto, se a afirma\u00e7\u00e3o de que o mundo est\u00e1 a mudar e rapidamente \u00e9 dita com bastante frequ\u00eancia, a esta descri\u00e7\u00e3o da ordem mundial juntaram-se recentemente dois atributos: o mundo est\u00e1 em fase de transi\u00e7\u00e3o e est\u00e1 de regresso a competi\u00e7\u00e3o entre as grandes pot\u00eancias.
Per\u00edodo de transi\u00e7\u00e3o \u2013 quando h\u00e1 uma altera\u00e7\u00e3o da capacidade relativa entre as grandes pot\u00eancias, esta gera uma instabilidade fundamental no sistema internacional e na maior parte dos casos, a guerra. Kissinger diz que n\u00e3o ser\u00e1 assim desta vez, porque a China junta ao marxismo uma tend\u00eancia confuciana que coloca em primeiro lugar a estabilidade e a ordem. Mas \u00e9 uma situa\u00e7\u00e3o de alta tens\u00e3o pol\u00edtico-estrat\u00e9gica.
A competi\u00e7\u00e3o entre as grandes pot\u00eancias significa, em termos estrat\u00e9gicos, que elas d\u00e3o prioridade absoluta aos seus interesses pr\u00f3prios, em detrimento daquilo que s\u00e3o os desafios comuns da humanidade. Durante muito tempo acreditou-se que as grandes pot\u00eancias tinham aceitado a realidade de que h\u00e1 desafios comuns (aquecimento global; terrorismo transnacional; crime organizado; pobreza e outros) que nenhuma pot\u00eancia por si s\u00f3 poderia resolver, pelo que s\u00f3 a seguran\u00e7a cooperativa faria sentido, mas esse entendimento pode estar a mudar.
Interessa-nos referir que a primeira sensa\u00e7\u00e3o que temos desta mudan\u00e7a \u00e9 a altera\u00e7\u00e3o econ\u00f3mica. No in\u00edcio do s\u00e9culo, as grandes economias (americana, europeia, japonesa e chinesa) estavam relativamente pr\u00f3ximas, mas este desequil\u00edbrio foi-se destabilizando ao longo do tempo. O crescimento cont\u00ednuo da China durante d\u00e9cadas, acima do n\u00edvel de crescimento dos outros blocos \u00e9 conhecido, mas a presen\u00e7a da China em todas as partes do Mundo acentua essa perce\u00e7\u00e3o.<\/p>\n\n\n\n

As Tend\u00eancias Geopol\u00edticas<\/h4>\n\n\n\n

Outras tend\u00eancias, todavia, marcam o presente e o futuro tendo o palestrante salientado as tr\u00eas mais significativas entre as grandes pot\u00eancias:
Nos EUA, a primeira grande tend\u00eancia \u00e9 a autossufici\u00eancia energ\u00e9tica \u2013 quando foi atingida, o M\u00e9dio Oriente deixou de ser vital para os EUA, porque era l\u00e1 que compravam parte essencial do seu petr\u00f3leo. A sua postura atual parece, pois, ser a de que a seguran\u00e7a da regi\u00e3o interessa mais a outros como a UE ou a China e os EUA t\u00eam que partilhar o \u201cburden\u201d da seguran\u00e7a ma regi\u00e3o.
Os EUA sofreram um desgaste profund\u00edssimo desde a queda do muro de Berlim, primeiro ao assumirem ser \u201ca pol\u00edcia do mundo\u201d num momento unipolar e depois do 11 de setembro com o envolvimento em guerras prolongadas, dolorosas e custosas, que fizeram com que os EUA gastassem cerca de 6 trili\u00f5es de d\u00f3lares, apenas nessas guerras. Comparando com a China, a Rota da Seda (a mais profunda altera\u00e7\u00e3o em curso) tem um custo estimado de cerca de 3 trili\u00f5es de d\u00f3lares o que d\u00e1 ideia do impacto do esfor\u00e7o dos EUA. Pior, no M\u00e9dio Oriente, quem est\u00e1 a posicionar-se para ficar com os louros da estabilidade na regi\u00e3o \u00e9 a R\u00fassia (e a Turquia), o que desvaloriza o grande esfor\u00e7o americano e desgaste econ\u00f3mico e humano na regi\u00e3o. A quest\u00e3o da America First parece ser pois \u00e9 uma consequ\u00eancia, n\u00e3o uma causa. Que n\u00e3o vem apenas da presente Administra\u00e7\u00e3o, pois j\u00e1 Obama referia a necessidade do \u201cstate building\u201d nos EUA, evidenciando esta fragilidade.
Finalmente, o grande desafio atual dos EUA parece ser o de como enquadrar a ascens\u00e3o da China. A ideia de que o desenvolvimento econ\u00f3mico traria a abertura democr\u00e1tica da China como stakeholder fundamental no mundo, n\u00e3o se concretizou como esperado. A China manteve a centraliza\u00e7\u00e3o e um regime de partido \u00fanico com ascend\u00eancia crescente do partido comunista, mantendo fechados setores econ\u00f3micos importantes. Nas rela\u00e7\u00f5es comerciais os EUA tiveram no \u00faltimo ano um d\u00e9fice t\u00e3o elevado com a China que se continuar ao mesmo n\u00edvel daria para financiar toda a Rota da Seda em 8 anos. A forma como os EUA equacionarem o relacionamento com a China ditar\u00e1, pois, boa parte do futuro mundial.
Em rela\u00e7\u00e3o \u00e0 China propriamente dita, ela transformou-se na \u201cf\u00e1brica do mundo\u201d. Com o apoio dos EUA e da UE entrou na Organiza\u00e7\u00e3o do Com\u00e9rcio Mundial e utilizou a sua abertura econ\u00f3mica e o seu grande mercado para se tornar no maior exportador mundial.
O segundo tra\u00e7o relevante na atitude da China diz respeito \u00e0 aproxima\u00e7\u00e3o \u00e0 R\u00fassia. Como dizia Brzezinski a maior revela\u00e7\u00e3o estrat\u00e9gica depois da queda do muro de Berlim foi a quantidade extraordin\u00e1ria de energia e de recursos minerais existentes na \u00e1sia central; a China tinha problemas de fronteira com todos esses pa\u00edses, que tinham sa\u00eddo da orla da URSS. \u00c9, pois, no tempo de Yeltsin, com a R\u00fassia em fal\u00eancia financeira, que se d\u00e1 a aproxima\u00e7\u00e3o da China e da R\u00fassia e a cria\u00e7\u00e3o da Organiza\u00e7\u00e3o de Coopera\u00e7\u00e3o de Shangai envolvendo todos os estados da regi\u00e3o. Nunca a China tinha estado t\u00e3o pr\u00f3xima da R\u00fassia. H\u00e1 aqui uma altera\u00e7\u00e3o profund\u00edssima, mas que lhe permitiu \u00e0quela lan\u00e7ar o Belt and Road.
Por outro lado, a China tem passado de ator global a uma pot\u00eancia tecnol\u00f3gica de ponta, concentrando sob o seu controlo v\u00e1rias \u00e1reas da atividade tecnol\u00f3gica do futuro (ex. intelig\u00eancia artificial; robotiza\u00e7\u00e3o) e isolando-as da competi\u00e7\u00e3o internacional. E, como refere a EU, est\u00e1 a assumir-se mesmo como competidor ideol\u00f3gico com o sistema democr\u00e1tico e as economias abertas ocidentais.
Finalmente, sobre a R\u00fassia. Qual \u00e9 a finalidade, o objetivo da R\u00fassia de Putin? Vem desde o primeiro Conceito Estrat\u00e9gico de 2000 a afirma\u00e7\u00e3o de que entre um mundo unipolar liderado pelos EUA e pelos pa\u00edses ocidentais desenvolvidos, a R\u00fassia ir\u00e1 promover um mundo multipolar. E tem repetido isso em todos os conselhos estrat\u00e9gicos subsequentes, para al\u00e9m de contribuir ativamente para tal, para que a R\u00fassia se possa assumir como um dos polos desse poder mundial.
Desde Pedro \u201co Grande\u201d, a R\u00fassia era um pa\u00eds ocidental, envolvido profundamente \u00e0s quest\u00f5es europeias desde o s\u00e9culo XVIII. Putin acabou com esta ideia: a R\u00fassia passou a ser considerado um pa\u00eds Euroasi\u00e1tico, que resultou de uma civiliza\u00e7\u00e3o desenvolvida ao longo do tempo, do contacto entre as dezenas de etnias nela existentes. Tem uma cultura pr\u00f3pria, um ethos espec\u00edfico que se perder\u00e1 com a aproxima\u00e7\u00e3o ao Ocidente, mas tamb\u00e9m ao Oriente. A afirma\u00e7\u00e3o da parceria estrat\u00e9gica com o ocidente deixou de constar em qualquer os conceitos estrat\u00e9gicos posteriores. A R\u00fassia passou a pretender afirma-se como um polo de poder de poder aut\u00f3nomo num mundo que pretende tornar multipolar.
Sendo um polo de poder que pretende afirmar a sua ascend\u00eancia sobre a periferia e a sua afirma\u00e7\u00e3o de pot\u00eancia a n\u00edvel mundial, a R\u00fassia tem olhado para a EU como uma entidade cuja afirma\u00e7\u00e3o e unidade s\u00e3o adversariais pelo que o seu enfraquecimento \u00e9 visto por muitos como ben\u00e9fico.
Significa para a UE que, pela primeira vez na sua Hist\u00f3ria, todas as grandes pot\u00eancias est\u00e3o tendencialmente contra ela. Os EUA porque preferem as rela\u00e7\u00f5es bilaterais. Para a China, a UE \u00e9 uma desnecessidade, porque pode limitar a sua capacidade aut\u00f3noma na europa. Para a R\u00fassia, a democracia t\u00e3o pr\u00f3xima das suas fronteiras pode ser contagiante para um regime de natureza autorit\u00e1ria.
Quando a Europa olha para as suas periferias temos: a leste as amea\u00e7as h\u00edbridas e o regresso da for\u00e7a ao continente; a sul a instabilidade e o desafio do crescimento demogr\u00e1fico que vai ocorrer na \u00c1frica (na realidade a duplica\u00e7\u00e3o da popula\u00e7\u00e3o africana); a oeste, temos os EUA voltados para dentro, protecionistas, bilateralistas e focados na China e em equilibrar o burden-sharing com a UE.<\/p>\n\n\n\n

Temos assim duas possibilidades gen\u00e9ricas quanto ao futuro:<\/h4>\n\n\n\n
  1. A Europa gradualmente transforma-se numa \u201c\u00e1rea de competi\u00e7\u00e3o\u201d entre as grandes pot\u00eancias. Com uma capacidade econ\u00f3mica e comercial total, significativas, mas com pouca capacidadeefetiva de atua\u00e7\u00e3o conjunta. No fundo uma entidade econ\u00f3mica relevante, mas um \u201can\u00e3o pol\u00edtico\u201d;<\/li>
  2. A Europa assume o des\u00edgnio de se constituir como um efetivo ator global, com capacidade pr\u00f3pria. Com uma afirma\u00e7\u00e3o econ\u00f3mica e comercial crescentes, promotora do entendimento e do normativo internacional, mas aceitando a responsabilidade de assumir a sua parte no estabelecimento da seguran\u00e7a e da estabilidade no mundo, nomeadamente na zona que a rodeia, responsabilidade que seja compat\u00edvel com a sua quota de cerca de 25% do PIB Mundial. \u00c9 aqui que eventualmente Macron e outros querem chegar quando, de forma mais ou menos direta, afirmam de que a Europa est\u00e1 mais s\u00f3.<\/li><\/ol>\n\n\n\n

    Seria uma patente imprud\u00eancia deixar a nosso futuro em m\u00e3os alheias, pelo que o nosso caminho ter\u00e1 que ser mais pr\u00f3ximo da segunda op\u00e7\u00e3o do que da primeira e desejavelmente seguindo a via da paz da estabilidade e da coopera\u00e7\u00e3o trazendo para o primeiro plano uma ordem internacional baseada na lei.
    Mas isso d\u00e1 mat\u00e9ria para outra troca de ideias que faremos convosco com o maior interesse.<\/p>\n\n\n\n

    Redigido por: <\/em><\/p>\n\n\n\n

    Federica Paolucci e Rita Monte<\/strong><\/strong>
    Membros da EuroDefense Jovem-Portugal <\/p>\n\n\n\n

    Coordena\u00e7\u00e3o:<\/em><\/p>\n\n\n\n

    \"\"<\/p>\n\n\n\n

    Ant\u00f3nio Fontes Ramos<\/strong><\/strong>
    Vice-Presidente da mesa do Conselho Geral<\/p>\n","protected":false},"excerpt":{"rendered":"

    Mesa Redonda EuroDefense Jovem-NESISCTE \u201cO Centro de Estudos EuroDefense-Portugal, membro da rede europeia de Associa\u00e7\u00f5es EURODEFENSE, tem como miss\u00e3o principal promover o debate sobre a pol\u00edtica europeia de Seguran\u00e7a e Defesa e suas implica\u00e7\u00f5es a n\u00edvel nacional\u201d Ant\u00f3nio Figueiredo Lopes, presidente da Dire\u00e7\u00e3o do EuroDefense-Portugal Nota de Abertura No dia 28 de novembro de 2019,… Ler mais »\u201cO que ser\u00e1 do Reino Unido e da Uni\u00e3o Europeia ap\u00f3s o Brexit\u201d<\/span><\/a><\/p>\n","protected":false},"author":1,"featured_media":2977,"comment_status":"closed","ping_status":"closed","sticky":false,"template":"","format":"standard","meta":{"neve_meta_sidebar":"","neve_meta_container":"","neve_meta_enable_content_width":"","neve_meta_content_width":0,"neve_meta_title_alignment":"","neve_meta_author_avatar":"","neve_post_elements_order":"","neve_meta_disable_header":"","neve_meta_disable_footer":"","neve_meta_disable_title":""},"categories":[17],"tags":[],"_links":{"self":[{"href":"https:\/\/eurodefense.pt\/wp-json\/wp\/v2\/posts\/605"}],"collection":[{"href":"https:\/\/eurodefense.pt\/wp-json\/wp\/v2\/posts"}],"about":[{"href":"https:\/\/eurodefense.pt\/wp-json\/wp\/v2\/types\/post"}],"author":[{"embeddable":true,"href":"https:\/\/eurodefense.pt\/wp-json\/wp\/v2\/users\/1"}],"replies":[{"embeddable":true,"href":"https:\/\/eurodefense.pt\/wp-json\/wp\/v2\/comments?post=605"}],"version-history":[{"count":9,"href":"https:\/\/eurodefense.pt\/wp-json\/wp\/v2\/posts\/605\/revisions"}],"predecessor-version":[{"id":1547,"href":"https:\/\/eurodefense.pt\/wp-json\/wp\/v2\/posts\/605\/revisions\/1547"}],"wp:featuredmedia":[{"embeddable":true,"href":"https:\/\/eurodefense.pt\/wp-json\/wp\/v2\/media\/2977"}],"wp:attachment":[{"href":"https:\/\/eurodefense.pt\/wp-json\/wp\/v2\/media?parent=605"}],"wp:term":[{"taxonomy":"category","embeddable":true,"href":"https:\/\/eurodefense.pt\/wp-json\/wp\/v2\/categories?post=605"},{"taxonomy":"post_tag","embeddable":true,"href":"https:\/\/eurodefense.pt\/wp-json\/wp\/v2\/tags?post=605"}],"curies":[{"name":"wp","href":"https:\/\/api.w.org\/{rel}","templated":true}]}}