{"id":6122,"date":"2021-04-16T18:22:35","date_gmt":"2021-04-16T18:22:35","guid":{"rendered":"https:\/\/eurodefense.pt\/?p=6122"},"modified":"2023-02-20T18:45:41","modified_gmt":"2023-02-20T18:45:41","slug":"a-crise-da-ucrania-e-da-europa","status":"publish","type":"post","link":"https:\/\/eurodefense.pt\/a-crise-da-ucrania-e-da-europa\/","title":{"rendered":"A Crise da Ucr\u00e2nia e da Europa"},"content":{"rendered":"\n
A crise que atualmente se vive na Ucr\u00e2nia \u00e9 um sintoma de que ainda existem feridas por sarar ap\u00f3s a queda da Uni\u00e3o Sovi\u00e9tica na Europa. Por se tratar de um conflito no continente europeu, isso representa, inevitavelmente, uma crise para todos os seus pa\u00edses que, apesar de lograr o seu longo per\u00edodo de paz, n\u00e3o impede que milh\u00f5es de pessoas vivam na mis\u00e9ria e com medo das consequ\u00eancias de conflitos armados. Aconteceu logo ap\u00f3s a queda da Uni\u00e3o Sovi\u00e9tica com a guerra dos Balc\u00e3s, na Ge\u00f3rgia e, nos \u00faltimos anos, na Ucr\u00e2nia.<\/p>\n\n\n\n
A Ucr\u00e2nia, um extenso pa\u00eds com uma \u00e1rea maior do que Fran\u00e7a e com mais de 41 milh\u00f5es de habitantes, vive numa indefini\u00e7\u00e3o pol\u00edtica desde a sua independ\u00eancia em 1991. Divide rela\u00e7\u00f5es com a Uni\u00e3o Europeia e a Federa\u00e7\u00e3o Russa, essa indefini\u00e7\u00e3o, resultou numa das mais violentas manifesta\u00e7\u00f5es vividas. O desespero dos ucranianos ao verem o seu presidente Viktor Yanukovych rejeitar um acordo econ\u00f3mico para a integra\u00e7\u00e3o da Uni\u00e3o Europeia e a estreitar outros acordos com a R\u00fassia, levou a que muitos sa\u00edssem \u00e0 rua no ano de 2014 e tornassem aquelas manifesta\u00e7\u00f5es um mote para a mudan\u00e7a. Infelizmente, o alargado per\u00edodo de manifesta\u00e7\u00e3o, aliado \u00e0 excessiva for\u00e7a policial, ditou a sa\u00edda do presidente que, conforme seria de esperar, se exilou na R\u00fassia.<\/p>\n\n\n\n
Em resposta \u00e0 derrota do governo perante os protestos, Vladimir Putin decide hostilizar ainda mais o conflito dando for\u00e7a aos separatistas pr\u00f3-Russos. A anexa\u00e7\u00e3o de territ\u00f3rios e a concess\u00e3o de material militar sofisticado fizeram deste conflito uma novidade no continente europeu desde a Segunda Guerra Mundial e da Guerra dos Balc\u00e3s. A forte presen\u00e7a russa e fraca ou quase omissa resposta do bloco ocidental, tem dado a este conflito uma ideia de que a Federa\u00e7\u00e3o Russa est\u00e1 disposta a atuar e que a sua capacidade de intimidar os seus advers\u00e1rios \u00e9 real.<\/p>\n\n\n\n
Esta crise e as suas movimenta\u00e7\u00f5es foram \u00fateis para a defini\u00e7\u00e3o das novas guerras, mais concretamente no conceito de guerras h\u00edbridas. Na Cimeira de Gales, da NATO (Organiza\u00e7\u00e3o do Tratado Atl\u00e2ntico Norte), esta abordagem russa foi definida como uma futura amea\u00e7a \u00e0 alian\u00e7a, onde movimentos civis e paramilitares apresentam capacidades acima do desej\u00e1vel, definindo a presen\u00e7a russa no conflito enquanto h\u00edbrida. (Fernandes, 2016)<\/p>\n\n\n\n
As imagens do combate que correram o mundo s\u00f3 podem chocar qualquer pessoa e denunciar claramente uma de duas hip\u00f3teses, ou a incapacidade da R\u00fassia conter a prolifera\u00e7\u00e3o dos seus sistemas militares ou a sua interven\u00e7\u00e3o direta no conflito. Desde os carros de combate, aos sistemas m\u00edsseis a\u00e9reos que ditaram a queda do avi\u00e3o comercial Malaysian Airlines MH17, \u00e0s fardas militares usadas pelos civis denotam a robustez e capacidade militar digna de um Estado e n\u00e3o de for\u00e7as paramilitares. Tudo isso evidenciou, direta ou indiretamente, a participa\u00e7\u00e3o russa. Foi preciso sentarem-se \u00e0 mesa Fran\u00e7a, Alemanha, R\u00fassia e Ucr\u00e2nia, para que os Acordos de Minsk, em 2015, acabassem com o uso de armamento pesado, num claro aviso aos principais financiadores do conflito.<\/p>\n\n\n\n
A todas estas amea\u00e7as hostis, a Uni\u00e3o Europeia precisava de uma resposta afirmativa e tamb\u00e9m ela dissuasora. Mais uma vez, no seio da NATO isso foi poss\u00edvel ainda que de forma subtil, batalh\u00f5es e artilharia fosse estacionada na Pol\u00f3nia num esfor\u00e7o conjunto de diversos pa\u00edses para que o inimigo se sentisse \u201cminimamente\u201d intimidado. Mas amenizar o conflito, n\u00e3o significa que este termine. A presen\u00e7a disfar\u00e7ada e h\u00edbrida dos russos, n\u00e3o deixou de existir, diversos ciberataques e um conjunto de for\u00e7as paramilitares bem fortes no combate contra a Ucr\u00e2nia, assim como as regi\u00f5es anexadas n\u00e3o deixaram de viver na mis\u00e9ria e com um constante perigo de conflitos armados.<\/p>\n\n\n\n
Estamos em 2021, o conflito para muitos ainda est\u00e1 longe de terminar. Estima-se que mais 3,5 milh\u00f5es de pessoas sejam afetadas diretamente pelo conflito e necessitem de assist\u00eancia humanit\u00e1ria. O terreno cont\u00e9m in\u00fameros res\u00edduos explosivos que se tornam numa das causas de morte daqueles territ\u00f3rios, as pessoas continuam a envelhecer e esta j\u00e1 \u00e9 considerada a crise humanit\u00e1ria \u201cmais velha\u201d do mundo.<\/p>\n\n\n\n
A par de toda esta realidade militar, a Uni\u00e3o Europeia continua a desempenhar as suas fun\u00e7\u00f5es conforme dita a regra. As negocia\u00e7\u00f5es para a Ucr\u00e2nia cumprir os requisitos econ\u00f3micos \u00e0 entrada na Uni\u00e3o Europeia est\u00e3o em vigor e uma vasta ajuda financeira tem sido ben\u00e9fica para a recupera\u00e7\u00e3o do pa\u00eds, assim como a abertura do pa\u00eds \u00e0 Uni\u00e3o. N\u00e3o h\u00e1 d\u00favidas de que pertencer \u00e0 Uni\u00e3o Europeia tem consequ\u00eancias muito vantajosas para os ucranianos, assim como para os europeus. Existem apenas alguns pontos onde a Uni\u00e3o ainda falha e insiste em continuar a falhar, \u00e9 na defesa dos seus cidad\u00e3os e aliados. Neste conflito, muitos ucranianos deram a sua vida pela Uni\u00e3o Europeia, lutaram e gritaram pelas suas ruas por n\u00f3s, ergueram bem alto a bandeira azul com as estrelas circulares com a ambi\u00e7\u00e3o de um dia poderem fazer tamb\u00e9m parte dela. Mas n\u00e3o tiveram a resposta que desejavam, ainda que as palavras duras dos l\u00edderes europeus para os que oprimiam a popula\u00e7\u00e3o ucraniana pr\u00f3-europa, fizeram-no sentados nas suas secret\u00e1rias, n\u00e3o auxiliaram ou se impuseram aos que diariamente atacaram civis inocentes. Continuamos a assistir distantes \u00e0s anexa\u00e7\u00f5es ilegais da R\u00fassia do territ\u00f3rio e apenas com batalh\u00f5es norte-americanos estacionados na Europa, conseguimos dissuadir a amea\u00e7a russa.<\/p>\n\n\n\n
\u00c9 urgente falarmos do futuro da Europa e mais ainda, de refor\u00e7armos a posi\u00e7\u00e3o conjunta com os Estados Unidos da Am\u00e9rica. O seu atual Presidente Joe Biden, n\u00e3o se apresenta tolerante \u00e0s amea\u00e7as russas em locais soberanos, como \u00e9 o caso da Ucr\u00e2nia. Numa altura em que a NATO decide abandonar a miss\u00e3o do Afeganist\u00e3o e refor\u00e7a a sua posi\u00e7\u00e3o na Ucr\u00e2nia, fazendo-nos recordar a hist\u00f3ria. O Afeganist\u00e3o foi invadido numa das \u00faltimas movimenta\u00e7\u00f5es hostis da Uni\u00e3o Sovi\u00e9tica, em 1979, uma \u00faltima tentativa de se afirmar militarmente na sua vizinhan\u00e7a, antes de colapsar. Agora, esse territ\u00f3rio ap\u00f3s 20 anos de interven\u00e7\u00e3o da NATO, parece estar em condi\u00e7\u00f5es para retomar a sua autonomia, \u00e9 tempo do bloco ocidental preocupar-se em mitigar as mais recentes ofensivas russas, pois a contesta\u00e7\u00e3o pol\u00edtica interna a Vladimir Putin, a fragilidade econ\u00f3mica e a crise demogr\u00e1fica, ao qual acresce a tentativa desmedida dos russos para fracionar o bloco ocidental (elei\u00e7\u00e3o de Donald Trump, Brexit e interven\u00e7\u00e3o nas elei\u00e7\u00f5es) n\u00e3o t\u00eam dado bom ar aos tempos que se avizinham.<\/p>\n\n\n\n
Passados sete anos e devido \u00e0 fraca capacidade de atuar em tempo, resta-nos reagir \u00e0 m\u00ednima ofensa das liberdades e direitos humanos no territ\u00f3rio Ucraniano. A Uni\u00e3o Europeia deve orgulhar-se de erguer a mesma bandeira que os ucranianos ergueram quando iniciaram as suas manifesta\u00e7\u00f5es em 2014. Uma bandeira que representa ideais democr\u00e1ticos, de um mundo livre e respeitador dos direitos humanos. Enquanto n\u00e3o conseguirmos que os pa\u00edses vizinhos ergam esses princ\u00edpios, n\u00e3o podemos estar confort\u00e1veis e expectantes que a migra\u00e7\u00e3o, muita dela em estatuto de refugiado, termine.<\/p>\n\n\n\n
16 de abril de 2021<\/p>\n\n\n\n
Miguel Carvalho Gomes<\/strong> Fontes:<\/p>\n\n\n\n Conflict in Ukraine. Council on Foreign Relations: https:\/\/www.cfr.org\/global-conflict-tracker\/conflict\/conflict-ukraine<\/span><\/a><\/p>\n\n\n\n Ukraine: Conflict at the Crossroads of Europe and Russia. Council on Foreign Relations: https:\/\/www.cfr.org\/backgrounder\/ukraine-conflict-crossroads-europe-and-russia<\/span><\/a><\/p>\n\n\n\n Fernandes, H. (2016). As Novas Guerras: O Desafio da Guerra H\u00edbrida. Revista de Ci\u00eancias Militares, novembro de 2016, IV (2), pp 13-40: https:\/\/www.ium.pt\/s\/wp-content\/uploads\/CIDIUM\/Revista%20Ci%C3%AAncias%20Militares\/RCM%20Vol.%20IV%20N.%C2%BA2%20-%20Hugo%20Fernandes%20-%20nov.%202016%20-%20As%20Novas%20Guerras%20…%20(PT).pdf<\/span><\/a><\/p>\n\n\n\n Facts and Figures about EU-Ukraine Relations: https:\/\/eeas.europa.eu\/sites\/default\/files\/eap_factsheet_ukraine_eng_web.pdf<\/span><\/a><\/p>\n\n\n\n Ukraine. Comiss\u00e3o Europeia, 06\/10\/2020: https:\/\/ec.europa.eu\/echo\/where\/europe\/ukraine_en<\/span><\/a><\/p>\n\n\n\n Publica\u00e7\u00f5es relacionadas<\/strong><\/p>\n\n\n\n
Coordenador da EuroDefense Jovem-Portugal<\/em><\/p>\n\n\n\n
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