{"id":840,"date":"2020-01-08T10:13:07","date_gmt":"2020-01-08T10:13:07","guid":{"rendered":"https:\/\/eurodefense.pt\/?p=840"},"modified":"2023-02-20T18:52:38","modified_gmt":"2023-02-20T18:52:38","slug":"a-europa-da-seguranca-e-defesa","status":"publish","type":"post","link":"https:\/\/eurodefense.pt\/a-europa-da-seguranca-e-defesa\/","title":{"rendered":"A Europa da Seguran\u00e7a e Defesa"},"content":{"rendered":"\n

An\u00e1lise das Cartas-Miss\u00e3o aos Alto Representante da UE para as Rela\u00e7\u00f5es Externas e de Seguran\u00e7a e Vice-Presidente da Comiss\u00e3o (que passaremos a designar por Alto Representante\/Vice-Presidente) e ao Comiss\u00e1rio para o Mercado Interno<\/em><\/p>\n\n\n\n

A nova Comiss\u00e3o<\/h5>\n\n\n\n

A Comiss\u00e3o Europeia \u00e9 o \u00f3rg\u00e3o executivo da Uni\u00e3o Europeia que defende os seus interesses gerais e, claro, o dos seus cidad\u00e3os, tomando para tal as iniciativas adequadas. \u00c9 uma Institui\u00e7\u00e3o politicamente independente, ocupando-se da elabora\u00e7\u00e3o de propostas de novos atos legislativos europeus e da execu\u00e7\u00e3o das decis\u00f5es do Parlamento Europeu e do Conselho da UE. Tem a incumb\u00eancia de propor a programa\u00e7\u00e3o anual e plurianual da Uni\u00e3o, de executar o or\u00e7amento aprovado e de gerir os respetivos programas. Al\u00e9m disso, a Comiss\u00e3o assegura a representa\u00e7\u00e3o Externa da UE, com a exce\u00e7\u00e3o da \u00e1rea da pol\u00edtica externa e de seguran\u00e7a comum que compete ao Conselho e \u00e9 conduzida pelo Alto Representante\/Vice-Presidente.
Em termos de composi\u00e7\u00e3o, a Comiss\u00e3o \u00e9 formada por uma equipa de Comiss\u00e1rios escolhidos pelo(a) Presidente designado(a), e tem um Mandato de cinco anos.
Ora, este \u00e9 um ano marcante para a Uni\u00e3o Europeia, uma vez que o mandato da atual Comiss\u00e3o, presidida por Jean-Claude Juncker termina a 31 de outubro de 2019, dando ent\u00e3o o lugar a uma nova presidente. Quem \u00e9 esta nova l\u00edder?
Ursula von der Leyen, ex-ministra da Defesa da Alemanha no governo de \u00c2ngela Merkel, \u00e9 a presidente indigitada para este t\u00e3o relevante cargo da UE. Ap\u00f3s ser eleita, a nova presidente prop\u00f5e o seu Col\u00e9gio de Comiss\u00e1rios, cada um dos quais tem de receber a aprova\u00e7\u00e3o por parte do Parlamento Europeu.
No \u00e2mbito da \u00e1rea de seguran\u00e7a e defesa, podemos destacar dois Comiss\u00e1rios com fun\u00e7\u00f5es particularmente relevantes: o espanhol Josep Borrell, Alto Representante\/Vice-Presidente, e o Comiss\u00e1rio respons\u00e1vel pelo Mercado Interno e pela nova Dire\u00e7\u00e3o-Geral da Ind\u00fastria da Defesa e do Espa\u00e7o, que \u00e9 atualmente o franc\u00eas Thierry Breton, ap\u00f3s a rejei\u00e7\u00e3o pelo Parlamento Europeu de Sylvie Goulard.
Ap\u00f3s ser eleita e escolher a sua equipa, Von der Leyen encarregou-se de escrever, como \u00e9 habitual, \u201ccartas-miss\u00e3o\u201d aos seus Comiss\u00e1rios, cartas essas que exp\u00f5em as diretrizes espec\u00edficas que dever\u00e3o orientar a sua a\u00e7\u00e3o.
Posto isto, o nosso objetivo \u00e9 fazer uma an\u00e1lise das orienta\u00e7\u00f5es que constam nesses documentos, que determinam objetivos para a nova Comiss\u00e3o 2019-2024. Embora a nomea\u00e7\u00e3o de Goulard tenha sido rejeitada pelo Parlamento, basear-nos-emos, ainda assim, no conte\u00fado da carta, que continua a ser pertinente e n\u00e3o foi substitu\u00edda. Ainda que ocupem cargos distintos, as cartas da presidente aos Comiss\u00e1rios de cada pa\u00eds apresentam um conte\u00fado semelhante a n\u00edvel de orienta\u00e7\u00f5es gerais. No entanto, cada comiss\u00e1rio recebe uma miss\u00e3o espec\u00edfica no que diz respeito \u00e0 sua \u00e1rea de atua\u00e7\u00e3o.<\/p>\n\n\n\n

Quais s\u00e3o, ent\u00e3o, as diretrizes pol\u00edticas gerais?<\/strong><\/h5>\n\n\n\n
1. Uma forma de trabalhar aberta e inclusiva<\/em><\/strong><\/h6>\n\n\n\n

Neste aspeto, Von der Leyen refor\u00e7a a import\u00e2ncia de trabalhar em conjunto, de forma aberta e inclusiva; para isso, considera necess\u00e1rio que os Comiss\u00e1rios \u201cfalem e se ou\u00e7am mais uns aos outros\u201d, algo que \u00e9 muito importante frisar, uma vez que existem \u00e1reas que se complementam ou que t\u00eam implica\u00e7\u00f5es m\u00fatuas, como veremos. Al\u00e9m disto, explicita o funcionamento da sua equipa, que, atrav\u00e9s do princ\u00edpio da colegialidade, ser\u00e1 constitu\u00edda por oito vice-presidentes que ter\u00e3o o poder de coordenar grupos de comiss\u00e1rios tem\u00e1ticos em cada uma das prioridades da comiss\u00e3o. Desses oito, tr\u00eas executivos liderar\u00e3o os grupos, apoiados por um secret\u00e1rio-geral, e gerir\u00e3o uma policy area, sendo que para essa tarefa ser\u00e3o apoiados por uma Dire\u00e7\u00e3o Geral. Ademais, o Alto-Representante\/Vice-presidente ajudar\u00e1 a coordenar a dimens\u00e3o externa do trabalho dos Comiss\u00e1rios, que ser\u00e1 sistematicamente discutida pelo Col\u00e9gio numa \u201cComiss\u00e3o Geopol\u00edtica\u201d, que n\u00e3o ter\u00e1 como principal objetivo gerir crises (compet\u00eancia do Conselho Europeu), mas sim analisar e dar coer\u00eancia \u00e0 multiplicidade de medidas e a\u00e7\u00f5es da UE com impacto no seu relacionamento externo, desde v\u00e3o desde as relativas ao com\u00e9rcio, apoio ao desenvolvimento, at\u00e9 \u00e0 ajuda humanit\u00e1ria. Em face da particular relev\u00e2ncia dada ao papel das Na\u00e7\u00f5es Unidas e seus objetivos, cada comiss\u00e1rio dever\u00e1 entregar um relat\u00f3rio United Nations Sustainable Development Goals dentro da sua \u00e1rea que explicite a participa\u00e7\u00e3o da UE no apoio \u00e0 consecu\u00e7\u00e3o deste t\u00e3o importante programa das NU.<\/p>\n\n\n\n

2. Rela\u00e7\u00f5es Interinstitucionais e melhor elabora\u00e7\u00e3o de pol\u00edticas<\/em><\/strong><\/h6>\n\n\n\n

Neste aspeto, \u00e9 real\u00e7ada a import\u00e2ncia de fortalecer as rela\u00e7\u00f5es entre a Comiss\u00e3o e as outras Institui\u00e7\u00f5es da UE, nomeadamente o Parlamento Europeu (juntamente com o Conselho), que deve ser informado com anteced\u00eancia de eventos importantes e momentos-chave de negocia\u00e7\u00f5es internacionais.
Por outro lado, a n\u00edvel de pol\u00edticas, pretende-se que o consenso seja criado mais rapidamente, atrav\u00e9s de uma abordagem mais aberta e cooperativa, para criar propostas e posteriormente normas que fa\u00e7am diferen\u00e7a na vida das pessoas e nos neg\u00f3cios \u2013 algo que, a prop\u00f3sito, pode ser feito atrav\u00e9s da estrat\u00e9gia One in, one out, isto \u00e9, uma regula\u00e7\u00e3o alvo em que se se cria um encargo numa \u00e1rea, p\u00f5e-se fim a outro j\u00e1 existente. Finalmente, havendo um foco na aplica\u00e7\u00e3o do Direito da Uni\u00e3o Europeia, pelo que todas as propostas devem ser feitas sob os princ\u00edpios da proporcionalidade e da subsidiariedade \u2013 pensando no que pode ser simplificado \u2013 com coer\u00eancia e evid\u00eancia. Estes dois princ\u00edpios desempenham um papel essencial em rela\u00e7\u00e3o \u00e0 perce\u00e7\u00e3o que os Estados devem ter da sua pr\u00f3pria atua\u00e7\u00e3o. Segundo o princ\u00edpio da subsidiariedade, a UE s\u00f3 dever\u00e1 assumir responsabilidades em quest\u00f5es dos seus Estados-membros se estes n\u00e3o tiverem capacidade para o fazer. Neste caso, a sua a\u00e7\u00e3o dever\u00e1 ser mais eficaz do que uma a\u00e7\u00e3o a n\u00edvel meramente nacional.<\/p>\n\n\n\n

3. Trazer a Europa para perto de \u201ccasa\u201d e aproveitar o m\u00e1ximo do potencial da UE<\/em><\/strong><\/h6>\n\n\n\n

Um dos objetivos mais importantes desta Comiss\u00e3o \u00e9 aproximar os cidad\u00e3os das institui\u00e7\u00f5es, fortalecendo os links entre as pessoas e as institui\u00e7\u00f5es. Neste ponto, interessa referir que a procura desse potencial pleno da Uni\u00e3o passa pela prioriza\u00e7\u00e3o dada \u00e0 geografia (para que n\u00e3o haja \u00e1reas exclu\u00eddas), \u00e0 experi\u00eancia (para que n\u00e3o se percam as boas pr\u00e1ticas e o conhecimento, a par da inova\u00e7\u00e3o e da criatividade) e o g\u00e9nero (para que n\u00e3o haja setores exclu\u00eddos ou inadequadamente representados no esfor\u00e7o coletivo). Para \u201ctrazer a Europa para perto de casa\u201d, \u00e9 nomeadamente considerado necess\u00e1rio que o Alto-Representante visite todos os estados-membros na primeira metade do mandato, que se encontre regularmente com os parlamentos nacionais e que fa\u00e7a parte do Di\u00e1logo de Cidad\u00e3os Europeus, como parte da Confer\u00eancia sobre o Futuro da Europa.<\/p>\n\n\n\n

Qual a miss\u00e3o espec\u00edfica de Josep Borrell?<\/strong><\/h5>\n\n\n\n

Josep Borrell ocupa um dos cargos mais importantes dentro da Comiss\u00e3o, enquanto Alto Representante\/Vice-Presidente, nomeadamente pelo seu papel de liga\u00e7\u00e3o entre o Conselho e a Comiss\u00e3o.
De facto, nos termos do artigo 18\u00ba do Tratado de Lisboa, o Alto Representante \u201cconduz a pol\u00edtica externa e de seguran\u00e7a comum da Uni\u00e3o\u201d, \u201ccontribui, com as suas propostas, para a defini\u00e7\u00e3o dessa pol\u00edtica, executando-a enquanto mandat\u00e1rio do Conselho\u201d e, para isso, preside ao Conselho dos Neg\u00f3cios Estrangeiros da UE. Enquanto Vice-Presidente da Comiss\u00e3o n\u00e3o s\u00f3 aporta ao debate nesta institui\u00e7\u00e3o do circunstancialismo da pol\u00edtica externa e de seguran\u00e7a da Uni\u00e3o definidas pelo Conselho, como se pode aperceber das a\u00e7\u00f5es em curso na \u00e1rea externa por parte da Comiss\u00e3o e identificar precocemente as possibilidades de juntar val\u00eancias e de desconflituar poss\u00edveis incongru\u00eancias.
Continuando um modo de funcionamento que se tinha iniciado na Comiss\u00e3o Juncker, \u00e9, pois, significativo e parece adequado que, na Miss\u00e3o ao Alto Representante\/Vice Presidente, se refira que este deve apoiar a Presidente da Comiss\u00e3o \u201cna coordena\u00e7\u00e3o da dimens\u00e3o externa da atividade de todos os Comiss\u00e1rios\u201d. E que para assegurar uma a\u00e7\u00e3o externa \u201cmais estrat\u00e9gica e mais coerente, esta ser\u00e1 discutida sistematicamente pelo Col\u00e9gio de Comiss\u00e1rios\u201d. Para isso todos os servi\u00e7os e gabinetes dever\u00e3o apresentar os aspetos externos nas respetivas \u00e1reas numa base semanal para apoiar as reuni\u00f5es do Col\u00e9gio de Comiss\u00e1rios.
Sobre a sua Miss\u00e3o propriamente dita parecem de referir, antes de mais, os dois pr\u00e9-requisitos iniciais. O primeiro a favor do multilateralismo e da necessidade de coopera\u00e7\u00e3o e de atua\u00e7\u00e3o com os outros, perante um mundo mais complexo e inst\u00e1vel; e o segundo, o da necessidade da maior lideran\u00e7a internacional da Uni\u00e3o Europeia, devendo para isso ser usado o nosso potencial diplom\u00e1tico e econ\u00f3mico para apoiar a estabilidade e prosperidade global, assim como para nos tornarmos mais competitivos e mais capazes de exportar os nossos valores e standards.
Para isso, a Presidente da Comiss\u00e3o prop\u00f5e uma Europa mais atuante no cen\u00e1rio internacional, pela atividade de uma \u201cComiss\u00e3o Geopol\u00edtica\u201d assente em v\u00e1rias a\u00e7\u00f5es de que destacam as seguintes:<\/p>\n\n\n\n

  • A formula\u00e7\u00e3o de uma Uni\u00e3o Europeia mais estrat\u00e9gica, mais assertiva com maior capacidade de atuar autonomamente;<\/li>
  • Com mais capacidade para decidir com rapidez e efici\u00eancia, ultrapassando os constrangimentos que limitam a nossa pol\u00edtica externa, nomeadamente tirando partido das cl\u00e1usulas que permitem decidir por maioria qualificada;<\/li>
  • Pela constitui\u00e7\u00e3o do \u201cGrupo de Comiss\u00e1rios para uma Europa mais Forte no Mundo\u201d que analisar\u00e1 a a\u00e7\u00e3o de todos os Comiss\u00e1rios com a\u00e7\u00f5es externas e ser\u00e1 dirigido pelo Alto Representante\/Vice-Presidente;<\/li>
  • Pela ado\u00e7\u00e3o de medidas vigorosas em dire\u00e7\u00e3o a um genu\u00edna Uni\u00e3o Europeia da Defesa<\/li><\/ul>\n\n\n\n
    E o do Comiss\u00e1rio respons\u00e1vel pelo Mercado Interno e Dire\u00e7\u00e3o-Geral da Ind\u00fastria da Defesa e do Espa\u00e7o?<\/strong><\/h5>\n\n\n\n

    A miss\u00e3o que tem de ser levada a cabo por Thierry Breton \u00e9 dividida em v\u00e1rios \u00e2mbitos. No da economia e da sociedade digital \u00e9 considerado essencial aprimorar a soberania tecnol\u00f3gica europeia, estando este ponto intimamente ligado com a \u00e1rea da defesa. Outro objetivo ser\u00e1 a cria\u00e7\u00e3o de um mercado \u00fanico de ciberseguran\u00e7a: joint cyber unit, \u00e1rea onde a UE tem tomado medidas significativas. Para al\u00e9m disso, a miss\u00e3o foca a necessidade de se tra\u00e7ar um plano de a\u00e7\u00e3o e educa\u00e7\u00e3o digital, pois de outra maneira dificilmente ir\u00e3o ser cumpridos os primeiros dois objetivos.
    No \u00e2mbito da ind\u00fastria europeia, a este Comiss\u00e1rio s\u00e3o pedidas v\u00e1rias colabora\u00e7\u00f5es nomeadamente no estabelecimento do plano de longo prazo para a estrat\u00e9gia industrial europeia; na realiza\u00e7\u00e3o do objetivo de uma economia climaticamente neutra em 2050; e na elabora\u00e7\u00e3o da nova estrat\u00e9gia para ajudar as PME a crescer e a expandirem-se, pelo acesso melhorado ao financiamento necess\u00e1rio. A este Comiss\u00e1rio \u00e9 atribu\u00edda a responsabilidade espec\u00edfica de velar pelo funcionamento regular do mercado \u00fanico e de remover as barreiras restantes no que se refere a bens e servi\u00e7os, de estabelecer condi\u00e7\u00f5es equitativas em todo o mercado \u00fanico e de contribuir para fazer face aos efeitos dos subs\u00eddios estrangeiros na distor\u00e7\u00e3o do mercado, em particular no que se refere aos contratos p\u00fablicos.
    Na \u00e1rea da ind\u00fastria de defesa e do espa\u00e7o que nos interessa particularmente neste estudo, a abordagem \u00e9 semelhante \u00e0 da anterior Comiss\u00e3o, e parte do reconhecimento do significado para a europa da ind\u00fastria da defesa e do espa\u00e7o. Assim \u00e9 salientado que esta \u00e9 respons\u00e1vel por uma fatura\u00e7\u00e3o de \u20ac100 bili\u00f5es por ano e salientada a import\u00e2ncia da pol\u00edtica do espa\u00e7o considerada um dos ativos mais valiosos e estrat\u00e9gicos da UE. \u00c9, pois, com este fundamento que atribui a este Comiss\u00e1rio as seguintes responsabilidades principais:<\/p>\n\n\n\n