Num sistema internacional marcado pela competição e pela incerteza, as alianças, que podem ser entendidas como uma relação formal ou informal de cooperação de segurança entre dois ou mais estados soberanos, assumida com o objetivo de aumentar a segurança dos seus membros contra ameaças externas percebidas, surgem como ferramentas essenciais para a protecção e a maximização da segurança nacional. A sua formação e manutenção dependem primariamente de cálculos estratégicos: os Estados buscam reduzir vulnerabilidades, equilibrar rivais e ampliar sua capacidade de influência. Factores como as percepções externas (como se interpretam os rivais) e as decisões políticas, tanto para o ambiente interno como externo, influenciam a operacionalização das alianças. Contudo, as influências da política interna só se tornam relevantes na medida em que afetam os interesses nacionais e a eficácia das respostas estratégicas da aliança.A NATO exemplifica esta lógica. O Tratado do Atlântico Norte de 1949, particularmente o Artigo 5.º, cria obrigações de defesa colectiva que tornam explícito o cálculo estratégico: um ataque a um é considerado um ataque a todos, reforçando a capacidade de dissuasão da aliança. A invocação do Artigo 5.º após os ataques de 11 de setembro de 2001 demonstrou que a credibilidade da aliança (a perceção de que o pacto será honrado) depende de uma avaliação racional de riscos por parte dos membros. Com as mudanças recentes no sistema internacional, especialmente depois da invasão russa da Ucrânia, percebeu-se também que o compromisso percebido entre os membros (a expectativa de que cada um cumprirá as suas obrigações) é mais relevante do que afinidades ideológicas ou valores partilhados para a sua eficácia. O essencial é que cada Estado reconheça que sua segurança depende da capacidade colectiva de dissuasão e da confiabilidade estratégica dos aliados. Outro exemplo relevante é a relação entre a União Europeia e a Ucrânia. O EU-Ukraine Association Agreement (2014) e as conclusões do Conselho Europeu após a invasão russa em 2022 evidenciam que a cooperação entre Estados, mesmo fora de uma aliança militar formal, pode funcionar como mecanismo estratégico de contenção de ameaças.
A convergência observada entre os Estados-membros da UE reflete cálculo político e estratégico: a manutenção da estabilidade europeia e a proteção de interesses geopolíticos, mais do que motivação por valores compartilhados, embora tenham o seu papel na estabilidade da aliança e dos acordos, orientaram a tomada de decisões. A política interna de cada país influenciou o timing e a forma de participação, maioritariamente subordinada à lógica de maximização da segurança e influência.
A criação da AUKUS em 2021 ilustra como alianças podem se adaptar a um ambiente multipolar e tecnológico. A parceria entre Estados Unidos, Reino Unido e Austrália, oficializada no Joint Leaders’ Statement, tem como objetivo reforçar capacidades estratégicas avançadas no Indo-Pacífico, equilibrando o poder frente à China. Este formato demonstra que, quando a distribuição de poder muda rapidamente, os Estados buscam instrumentos de segurança específicos que atendam directamente aos seus interesses nacionais, sem depender de compromissos amplos ou de coerência ideológica entre parceiros.
As alianças, no entanto, não são isentas de riscos. A dependência de aliados maiores ou a necessidade de responder a crises que não seriam prioritárias para um Estado individual exemplificam o dilema entre segurança colectiva e autonomia estratégica. As revisões das Estratégias de Defesa Nacional de países europeus após 2022 mostram que, mesmo em alianças consolidadas, a adaptação contínua é essencial. Isto é vital para recalibrar os objetivos de segurança face a novas ameaças e garantir que os compromissos aliados não comprometam os interesses estratégicos fundamentais e a autonomia de decisão do Estado.
Em última análise, as alianças parecem ser instrumentos pragmáticos: sua eficácia deriva da capacidade de coordenar esforços e maximizar o poder relativo diante de ameaças percebidas, mais do que da construção de valores comuns ou de uma identidade coletiva, embora estes possam exercer um papel agregador. Elas ampliam as capacidades dos Estados e permitem enfrentar desafios complexos. Contudo, a aliança é um recurso externo de segurança que não substitui a necessidade de avaliação estratégica constante, que é tão crucial quanto a própria capacitação de meios internos para a segurança nacional. Se há coisa que a Guerra na Ucrânia veio demonstrar é que a segurança global é reforçada na medida em que os Estados utilizam alianças de forma racional, subordinando os compromissos coletivos à lógica de interesse nacional e à realidade do equilíbrio de poder.
Lisboa, 03 de dezembro de 2025
Pedro Miguel Almeida
EuroDefense-Jovem Portugal
Referências bibliográficas
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(https://www.consilium.europa.eu/pt/meetings/europeancouncil/
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The White House, Joint Leaders’ Statement on AUKUS, 15 September 2021. (https://bidenwhitehouse.archives.gov/briefing-room/statementsreleases/
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Walt, S. M. (1987). The Origins of Alliances. Cornell University Press.


