Apresentação sumária do estudo realizado pelo EURODEFENSE Working Group (EWG 26B)
CONSIDERAÇÕES GERAIS
Os desafios globais resultantes das alterações climáticas confrontam a sociedade do presente e do futuro. A necessária transição energética que surge associada a este fenómeno reflete-se em todos os programas estratégicos, políticos e científicos em curso, em especial desde o início do século XXI e com particular ênfase na Europa. As políticas energéticas são muito relevantes no contexto económico e social dos Estados europeus e não escapam aos comportamentos e orientações mais gerais da geopolítica global. E afetam e condicionam de forma muito direta as questões da segurança e da defesa.
O mote e o enquadramento temático estavam assim dados, para o que viria a ser a constituição em meados de 2021 de um Grupo de Trabalho (WG) internacional no âmbito da rede EURODEFENSE, liderado pelo Centro de Estudos EuroDefense (ED) – Portugal e com a participação de elementos das ED de Espanha, França e da Federation of European Defence Technology Associations (EDTA) dos Países Baixos.
O mote e o enquadramento temático estavam assim dados, para o que viria a ser a constituição em meados de 2021 de um Grupo de Trabalho (WG) internacional no âmbito da rede EURODEFENSE, liderado pelo Centro de Estudos EuroDefense (ED) – Portugal e com a participação de elementos das ED de Espanha, França e da Federation of European Defence Technology Associations (EDTA) dos Países Baixos.
O começo de uma nova década veio de facto acelerar este debate, onde a mensagem aporética predominou com o inesperado abalo que a epidemia da COVID-19 trouxe ao mundo, obrigando à criação de sinergias, convocando resiliências e antecipando novas e inusitadas respostas à sociedade como um todo. E igualmente de forma dramática, a Europa viu-se constrangida mais tarde, pelo desencadear da guerra na Ucrânia. Foram todos estes factos e envolvências que o WG teve rapidamente de acondicionar nas suas análises ao longo dos trabalhos a desenvolver.
Quando falamos de sistemas energéticos inovadores, ou mesmo sistemas integrados, tecnologias emergentes e disruptivas, temos a noção, ainda que parcial, das suas implicações futuras, também na componente da segurança e defesa, e nas capacidades militares a levantar no âmbito das prioridades definidas pelos Estados. Também os projetos tecnológicos a serem desenvolvidos prioritariamente nas plataformas industriais civis, com vista à sua aplicação na área da defesa, estarão necessariamente em correlação com os modelos energéticos e com as respetivas normas de segurança ambiental. Esta simbiose prospetiva obriga a caminhar, a prazo, para uma sinergia de ações coerentes e sustentáveis. O referencial de análise e de controlo nestas áreas, pela sua complexidade, será sempre o de alargados períodos de tempo. Como sabemos, os grandes planos energéticos apontam para modelos base de maturação com alcances de 10 a 30 anos. O mesmo se passa no desenvolvimento dos grandes projetos inovadores para equipamentos de ponta, para serem empregues no campo da defesa. A Economia da Defesa tem aqui um papel preponderante.
Os novos espaços energéticos vão efetivamente contribuir para uma economia de baixo carbono, sejam na geração elétrica/térmica, na indústria, no espaço residencial ou mesmo nos transportes. Toda esta nova matriz energética em construção, deverá ter nas atividades de segurança e defesa e nas suas estruturas operacionais um forte impacto a médio e longo prazo.
Os desafios deste tempo passam por uma equação geopolítica ajustada à nova realidade, onde a obtenção de energia sustentável, a segurança energética e as medidas de controlo sobre as alterações climáticas deverão poder proporcionar uma adequada autonomia estratégica à Europa, aliada à necessária soberania económica, face às grandes potências globais e regionais.
OBJETIVOS DEFINIDOS PARA O EWG 26B[1]:
- Proporcionar o estudo, investigação e debate das questões da Geopolítica Energética (nomeadamente da Energia, Clima, Segurança e Defesa);
- Acompanhar e identificar os novos domínios científicos, tecnológicos e industriais de base energética do setor civil, como potencial de complementaridade e ligação à Base Tecnológica Industrial de Defesa Europeia (BTIDE), tendo por base a componente de Segurança e Defesa;
- Acompanhar os desenvolvimentos e atividades das políticas de Segurança Energética no quadro da UE e da NATO, nomeadamente no campo das novas energias;
- Contribuir para a divulgação das atividades deste âmbito, realizadas pela rede EURODEFENSE;
- Formalizar um conjunto de recomendações relativas às temáticas anualmente abordadas nos EWG, e a apresentar e debater em reuniões da “EURODEFENSE Presidential Conference”;
- Elaborar um documento de base a endereçar aos Presidentes da Comissão Europeia, do Conselho Europeu e do Parlamento Europeu, assim como ao Alto Representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança, e outros órgãos relevantes a considerar. Contribuir desta forma para uma Estratégia Energética no âmbito da Defesa Europeia, inserida no quadro da Autonomia Estratégica da UE, acompanhando a edificação das novas políticas energéticas previstas no “The European Green Deal”, “EU Strategic Compass”, “Climate Change and Defence Roadmap” e outros documentos relevantes no âmbito da “Defence Package”, acompanhando ainda diversas outras iniciativas realizadas neste âmbito.
Por forma a dar maior coerência aos trabalhos e aos objetivos pretendidos a desenvolver foram consideradas três grandes áreas balizadoras do estudos: A Perspetiva Geopolítica (Parte A), As Políticas Energéticas e Modelos (Parte B) e a Perspetiva Tecnológica (Parte C)[2].
Esta apresentação pretende apenas dar ao leitor e público-alvo interessado nesta temática, uma genérica abordagem dos trabalhos efetuados. Por isso remetemos para os Anexos ao texto, toda a curiosidade e interesse que possa haver, e onde poderão ser consultados os demais trabalhos efetuados, nas suas diferentes áreas. Também se disponibiliza o documento “Recommendations on EU Energy, (Security and Defence)” datado de fevereiro de 2023 e enviado às principais instituições europeias, assim como a respetiva carta de resposta da Comissão Europeia.
PARTE A: PERSPETIVA GEOPOLÍTICA
As principais conclusões e recomendações canalizam o foco no conceito da nova energia geográfica, num mundo que emergirá da nova transição energética e que será muito diferente daquele que conhecemos hoje baseado nas energias fósseis. Nesta perspetiva o poder será mais descentralizado e difuso, onde a maioria dos Estados terão capacidade e potencial acrescido para garantir por si maior independência energética. Outro dos pontos considerado centraliza-se nos complexos efeitos das alterações climáticas e as implicações relativas ao designado “defence nexus” e que terão consequências em múltiplos aspetos do planeamento estratégico militar, nomeadamente: na natureza e nas circunstâncias da tradicional atividade das forças militares que deverão ser alteradas/adaptadas, nomeadamente como (resposta aos desastres naturais, proteção das infraestruturas criticas, assim como em outras situações extremas de vagas de calor ou frio, epidemias etc). Mas também tendo em conta que a natureza dos conflitos irá ser alterada (mais globalizada, com maior impacto das migrações e populações deslocadas, conflitos sobre a água e outros bens e recursos escassos). No conjunto desta evolução e dos próprios conteúdos energéticos, também os equipamentos dos militares sofrerão profundas alterações e adaptações.
As recomendações e propostas articularam-se ao nível da segurança de abastecimento (reforço da política energética europeia ao nível da unidade e coordenação de esforços, e nas intenções e na diversificações das respetivas políticas de abastecimento). Outros dos pontos considerados são a relevância da questão dos custos e das compatibilidades com o desenvolvimento económico dos Estados europeus (centros de aquisição de combustíveis partilhados, e decisões a tomar tendo em conta as prioridades a atingir nos mix energéticos dos países europeus e a clarificação dos diferentes níveis a atingir na competição industrial e económica entre os diversos setores económicos, tendo por referência o balanço entre as necessidades ambientais e os respetivos custos sociais.
Foram também relevados na análise geopolítica efetuada, as questões dos impactos ambientais e das políticas energéticas a adequar (revisão do encerramento de centrais nucleares, o grau de desenvolvimento e capacidade das energias renováveis, captura e armazenamento do CO2, e a aceleração da eletrificação industrial, garantindo a substituição dos combustíveis fósseis, apoiando-se na implementação de soluções comerciais disponíveis ou em tecnologias emergentes).
Por fim é dado destaque às repercussões nas áreas de Segurança e Defesa das questões ambientais e das alterações climáticas (a questão equacionado do “Single Fuel Policy” e a importância da estandardização dos combustíveis a utilizar, ainda que com a necessária flexibilização em função dos vários estádios de evolução da transição energética em curso). A ligação destes pressupostos ao planeamento estratégico militar e em termos mais gerais à Política Comum de Segurança e Defesa (PCSD) e à NATO Smart Defence, entre outras abordagens comparativas, e que são aqui amplamente desenvolvidas nesta parte do estudo.
PARTE B: POLÍTICAS ENERGÉTICAS E MODELOS
Foi dado realce às políticas parcelares já em execução e aos diferentes patamares de cooperação ao nível da União Europeia (“The Climate Change and Defence Roadmap” – The European External Action Service (EEAS), da Comissão Europeia (defence package com o Fundo de Defesa Europeu (EDF) em evidência e nomeadamente do seu cluster “Energy resilience and environmental transition”). Também com a European Defence Agency (EDA) – “CapTech on Energy and Environment (EnE)”. Ao nível da NATO com o “The Climate Change and Security Agenda”.
As principais recomendações e propostas salientam a necessidade urgente das instituições europeias identificarem e monitorizarem muito daquilo que de uma ou ou outra forma está já em execução. Nomeadamente privilegiando a criação de um específico roadmap europeu que poderia conter objetivos como: (seguir e identificar desenvolvimentos dos projetos como os resultantes do Smart Energy Camps (EDA) ou do Smart Energy Initiative (NATO) e ainda outras iniciativas similares da UE; identificar potenciais novos mecanismos e capacidades energéticas tendo em atenção as especificidades militares; e ao nível operacional militar utilizar os respetivos exercícios militares sempre que possível para testar a viabilidade e a maturidade de materiais e de soluções técnicas experimentadas; Permitir que em situações apropriadas, os próprios setores da defesa (EDA, DEFIS, NATO) possam monitorizar os desenvolvimentos tecnológicos relevantes no campo da transição energética. A combinação dos esforços nacionais, a cooperação multinacional (EU/NATO) e a Indústria de Defesa serão certamente a chave para atingir estes objetivos.
PARTE C: PERSPETIVA TECNOLÓGICA
A necessidade de garantir e manter a robustez operacional dos meios e a perspetiva de uma adequada transição energética para o setor da defesa, implica de acordo com as conclusões do GT, de ter em devida conta: a perceção da diferenciação do que são as soluções técnicas a curto, a médio e a longo prazo; o imprescindível investimento em inovação e novas metodologias tecnológicas; promoção da “energy availability” e o desenvolvimento de sistemas não fósseis que garantam compatibilidades logísticas e de ação.
Este subgrupo investigou prioritariamente questões de eficiência e conservação energética; o papel do hidrogénio e dos “synthetic e-fuels”; a aplicação de tecnologia nuclear em pequena e média escala e também a “smart defence application” a sua integração e design.
Por ser tecnicamente um área muito específica, apresentamos apenas as grandes linhas consideradas no estudo, salientado nas recomendações e propostas alguns projetos analisados. Assim, destacam-se potenciais projetos ao nível da “energy storage” para baterias ou hidrogénio, alguns projetos baseados em metodologias específicas de “ducted fuel injections” (DFI), “diesel/water-emulsion” (DWE) e mesmo “engineered oxymethylene ethers” (OME). De igual forma foram consideradas as tecnologias híbridas e outras ligadas ao metanol e amónia na qualidade de combustíveis clean, dependendo fundamentalmente da tipologia da sua produção. Foram também considerados para desenvolvimento e em situações especificas, os micro reatores nucleares e a utilização de forma sustentada para substituição dos tradicionais combustíveis fósseis dos “sustainable synthetic fuels”. Para além destes e outros projetos foram considerados alguns elementos, como as aplicações modulares de base energética para determinadas plataformas (especialmente navios), os UAVs, os sistemas laser de alta energia e “rail-guns” e o investimento em processos de digitalização e 3D para componentes logísticas específicas.
“A combination of national efforts realistically coordinated at EU level, multinational cooperations and Defense Industry´s imputs will be the key to respond to all challenges. One essential issues will be to ensure energy supply to the armed forces.”
(Extrato – parágrafo final da carta com as “Recomendações do WG” enviada pelo EURODEFENSE às entidades europeias e assinada por Robert Walter, Presidente do EuroDefense-Reino Unido (ED-UK) e Presidente em funções da rede EURODEFENSE.
30 de outubro de 2023
Eduardo Caetano de Sousa
Coordenador do EWG26B
[1] De referir que este GT surge na sequência metodológica de um outro anterior, o EWG26, dada a continuidade do tema base a desenvolver, a Energia, ainda que numa estrutura totalmente diferenciada.
[2] A distribuição e a composição dos subgrupos de trabalho encontram-se na última parte do texto.
Lista dos Participantes no EURODEFENSE Working Group 26B
ANEXOS
ANEXO A – Energy geopolitics and spheres of influence (Subgroup A — ED-SP)
ANEXO D – Recommendations on EU Energy (Security and Defence)