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A União Europeia pretende agora assumir e projetar a liderança global das novas políticas ambientais, da descarbonização e, do emprego em larga escala das energias renováveis, apresentando aos seus Estados-membros metas e objetivos precisos. A recente Comissão Europeia (CE) e o Parlamento Europeu estão em sintonia. E chegamos ao atual «THE EUROPEAN GREEN DEAL», o Pacto Ecológico Europeu, lançado em Bruxelas em 11 de dezembro 2019, que assenta, num programa estruturado em 10 pilares e 50 iniciativas, e que pretende atingir os seus objetivos até 2050. A Europa ambiciona ser uma «Global Leader» na expressão da Presidente da CE, Ursula Von der Leyer; o que nos leva a concluir que a UE aspira a ser uma verdadeira Potência Climática, no espaço geopolítico global.

Um novo discurso na geopolítica energética

Os debates sobre GEOPOLÍTICA DA ENERGIA levados a cabo nas últimas décadas, por reconhecidos autores na vertente energética, e especialistas nas questões de geopolítica internacional e da segurança e defesa, têm sido, por norma, focalizados em duas variáveis, de alguma forma controladas e complexas: a capacidade de obtenção da energia e a segurança energética[1]. Em ambos estes elementos estruturais do debate, surgem os vínculos das necessidades vitais da soberania inerente aos Estados, com responsabilidades diretas no bem-estar da população, no desenvolvimento técnico e científico, na sustentabilidade da estrutura económica e comercial, relação com as empresas e hubs do setor energético e do tecido industrial, e nos fóruns científicos e universitários. Nesta equação não deixaram de estar presentes a componente da diplomacia política e económica, e os pressupostos da segurança e da defesa nacional. Convocam-se assim, os interesses dos Estados e das regiões, e das suas relações no comércio internacional globalizado. Esta mesma equação, é nos dias de hoje alterada no seu modelo de análise, pela introdução de uma nova variável, também ela de grande impacto global – o CLIMA, nomeadamente a parte resultante das atividades antropogénicas. Assim, é agora com base nestes três elementos: obtenção da energia, segurança energética e clima, que melhor poderemos discutir o tema dos desafios energéticos que se colocam à União Europeia.

Existe um consenso alargado aos vários níveis da sociedade, sobre os fenómenos ambientais e que afetam em contínuo e de forma acelerada o nosso planeta, em especial as alterações climáticas e os seus previsíveis efeitos no tempo. O consenso abrange desde um vasto leque de cientistas, a entidades várias e, sobe ao patamar das principais organizações internacionais como a ONU; até o próprio Banco Central Europeu (BCE) procura agora uma fórmula adequada e própria, a fim de poder intervir a tempo neste processo.

A construção histórica da realidade energética que tem percorrido a humanidade, foi registando diversas etapas e desenvolvimentos ao longo do tempo, que se traduziram sempre numa inimaginável e acelerada evolução do mundo, e das condições de vida do ser humano e da sociedade em que vivemos. Que o diga o século XX! Se bem que, em inúmeras situações, se tenha criado um regime de acentuadas desigualdades existentes entre o Norte e o Sul, entre continentes, e mesmo entre áreas rurais e as cidades. Contudo, o fator evolução e a extraordinária melhoria das condições de vida dos habitantes deste planeta, não são questionáveis.

Assistimos no passado a grandes fenómenos de transições energéticas. Umas realizadas em tempo mais lento, outras à velocidade estonteante da ciência e da tecnologia. Infelizmente, muitas delas resultantes das necessidades urgentes dos ditos imperativos «nacionais», aceleradas pelos grandes conflitos armados das Guerras Mundiais, ou decorrentes de diferentes processos heteróclitos. Esta transição energética que assistimos nestas décadas iniciais do século XXI, é a consciencialização dos desafios atuais e da nossa realidade e, pela qual somos inteiramente responsáveis.

A União Europeia na verdade, sempre conviveu com grandes preocupações nas áreas das políticas energéticas e ambientais: a própria perceção da importância dos efeitos ambientais nunca deixaram indiferentes os próprios fundadores do modelo europeu em meados do século XX. A segurança energética por seu lado, com as crises petrolíferas nos anos setenta e do gás natural em 2006, 2009 e 2014 – que culminaria com o fim geopolítico pré-anunciado da anexação da Crimeia -, forneceu matéria mais que suficiente aos Estados europeus, para integrar este decisivo vetor no patamar das preocupações do projeto europeu. Mais recentemente, o modelo de liberalização do setor energético, procurou dotar a Europa de mecanismos de livre concorrência e de acessos aos mercados, e em simultâneo dotá-los de regras de proteção. Os passos e avanços efetuados neste âmbito foram pequenos, na opinião de muitos, pelas dificuldades de consenso e da complexificação deste processo, mas cada vez mais seguros e firmes, para enfrentar os desafios que se colocavam ao modelo económico, político e monetário de cariz único no Mundo, protagonizado por um vasto conjunto de nações democráticas.

O despertar Climático

A Europa (União Europeia) pretende agora assumir e projetar a liderança global das novas políticas ambientais, da descarbonização e, do emprego em larga escala das energias renováveis, apresentando aos seus Estados-membros metas e objetivos precisos. A recente Comissão Europeia (CE) e o Parlamento Europeu estão em sintonia. E chegamos ao atual «THE EUROPEAN GREEN DEAL», o Pacto Ecológico Europeu, lançado em Bruxelas em 11 de dezembro 2019, que assenta, num programa estruturado em 10 pilares e 50 iniciativas, e que pretende atingir os seus objetivos até 2050. A EUROPA ambiciona ser uma «Global Leader» na expressão da Presidente da CE, Ursula Von der Leyer; o que nos leva a concluir que a UE aspira a ser uma verdadeira Potência Climática, no espaço geopolítico global.

Os principais desafios do novo Pacto Ecológico Europeu na área energética, apontam para a necessidade técnica de se alcançar a neutralidade climática ou carbónica até 2050. Pretende-se, ainda assim, avançar mais depressa do que o previsto, sugerindo-se metas de redução de Gases com Efeito de Estufa (GEE), de 50 a 55% até 2030 (comparados com os valores de 1990); aguarda-se pela anunciada Lei Climática (em março de 2020). Outro dos desafios passará por potenciar a regulação do setor energético e do próprio mercado do carbono (a Europa joga aqui em casa, pois já é por norma uma potência normativa). De igual forma, garantir um cenário de sustentabilidade energética e de crescimento económico, investindo na economia energética, na inovação e na ciência[2]. Com tanta ambição, a UE pretende estar na frente da revolução energética mundial (ser um ator internacional/Global Leader). Para isso, é naturalmente preciso um orçamento dedicado, e aqui reside um dos grandes problemas, tal o desencontro que os vários «blocos internos» assumem, quando pretendem disputar os emergentes «fundos estruturais[3]».

Numa Europa onde os principais setores responsáveis pelas emissões de GEE são: a eletricidade, seguido pelos transportes, indústria, o setor agrícola e as componentes residenciais, as medidas aqui apresentadas irão afetar de forma transversal todos eles. Por outro lado, os maiores emissores são naturalmente os Estados mais ricos, mais industrializados e de maiores dimensões. Não espanta que a Alemanha, o Reino Unido, França, Itália, Polónia e Espanha, sejam de longe os maiores poluidores. A própria navegação e transporte marítimo que entra e sai da Europa, assume um peso maior do que a República Checa ou a Bélgica como um todo. A conjugação de todos estes interesses, constituirá o verdadeiro afinador desta «Grande Estratégia» europeia. A representação gráfica do setor elétrico na UE, ainda nos mostra a realidade da existência dos quatro grandes blocos de fontes de energia primária: As renováveis, a tomarem a dianteira, seguidas pelo nuclear, o gás natural e o carvão. Na verdade, estamos a caminhar para o fim da era do carvão na Europa, que não ainda a nível mundial, diga-se. Mas até por memória, devemos lembrar-nos que a história da união da Europa, começa com a Comunidade Europeia do Carvão e do Aço (CECA) em 1951, inspirada por Robert Schuman e Jean Monnet. As fontes fósseis foram, de alguma forma, também uma procura ambiental ao longo dos tempos: o período do carvão impediu a contínua destruição das grandes zonas florestais na Europa (em especial no Reino Unido e norte da Europa), a partir do Séc. XVI. A era do petróleo veio limitar os intensos smog e nevoeiros de fumos e poluição dos grandes centros industrializados das cidades, provocados pelo uso intensivo do carvão. Depois o gás natural e o nuclear que vieram contribuir para reduzir as emissões geradas pelo petróleo e pelo carvão[4]. Agora as energias renováveis e o previsível scaling up do hidrogénio. E no futuro outras fórmulas energéticas surgirão certamente. O carvão é efetivamente o «mau da fita»; é a fonte energética mais poluente, não só na sua produção, mas em todo o seu ciclo de vida; contém 72 dos 118 elementos químicos da tabela periódica e os elementos mais poluentes. Encontra-se ainda em grande percentagem de utilização, em muitos países europeus como a Alemanha, Polónia, República Checa, Itália e Espanha. Para lá vão convergir certamente os esforços dos fundos e mecanismos de apoio comunitários destinados a este fim. A Europa apresenta um consumo global de carvão ligeiramente inferior aos Estados Unidos, mas a Índia (452 Milhões de Toneladas (MT) – e a China com 1906 (MT) (Fonte BP 2019), assumem claramente a dianteira. A Agência Internacional de Energia (AIE) confirma mesmo uma subida do carvão para valores globais de 38% para 40% no mix elétrico, com as recentes importações realizadas pela China. O fim das centrais a carvão por toda a Europa até 2050, permitirá diminuir em cerca de 800 MT as emissões anuais de CO2. A aposta na eletrificação, nas novas energias renováveis, no hidrogénio e no modo de transição energética representado pelo gás natural, são agora o caminho estratégico da Europa.

Os desafios do novo Pacto Ecológico Europeu terão especial incidência no campo político, económico e social. Devem poder reforçar o modelo de desenvolvimento económico e político da UE (pós-Brexit), e projetar um novo e mais eficiente modelo industrial e tecnológico. Existe sem dúvida, uma nova revolução industrial e digital em curso – e com toda a certeza acompanhadas de uma revolução sociológica -, dando conteúdo ao espaço de cidadania europeia, procurando ligar os políticos e a política aos eleitores e aos jovens. No que à geopolítica diz respeito: confrontar as grandes potências hegemónicas (EUA, Rússia e China) com a política climática e de defesa do planeta (como se viu na recente Cimeira de Davos), encontrando aqui um espaço próprio de atuação estratégico.

Constrangimentos e complexidades do Espaço Energético Global

Mas a UE percebe que as dificuldades a encontrar serão muitas e de difícil resolução. Os constrangimentos mais visíveis que podemos observar, passam por encarar a realidade que nos diz que a matriz energética global é muita diversa; que os interesses do Estados-membros são múltiplos e por vezes parecem inconciliáveis. A UE não é uma potência energética (recursos, capacidade técnica, científica e de investimento); é ainda muito dependente da Rússia (gás natural e petróleo); e dos EUA (tecnologia, investimento e mercados financeiros); e começa a ser da China (investimentos, novas tecnologias) e mesmo no futuro próximo, da componente dos minerais estratégicos. Convém aqui recordar que a Europa importa ainda cerca de 53% da sua energia, e Portugal tem um valor bem mais elevado (acima dos 75%). São também vastos os riscos e desafios em áreas críticas, como o digital e a cibersegurança e ciberdefesa. E por fim, como sabemos, a UE não garante autonomamente a sua Segurança e Defesa, e espelha essas vulnerabilidades perante as grandes potências globais ou mesmo regionais, nos cenários geopolíticos complexos e mais recentes.

A realidade global das fontes de energia primária é bem mais complexa. O petróleo é ainda energia mais utilizada, mas em queda acelerada (34%). O carvão ainda representa cerca de com 27%. O gás natural tem subido continuamente, atingindo os 24%. A hidroelétrica e a nuclear permanecem estáveis a 7% e 4% respetivamente, e constata-se a subida das novas renováveis para 4% (Dados BP 2019 statistical review of world energy). Por seu lado, as necessidades energéticas até 2040 (AIE) estimam-se que possam aumentar 30% (ou seja o equivalente a uma nova China ou Índia). Convém também ressaltar, o peso energético da Ásia (nomeadamente da China, Índia, Coreia do Sul, e Japão) e do forte crescimento de África em todos os cenários para 2050 e 2070.

Mas também na geopolítica não existe um planeta B. Prevalecem os interesses das Estados e das regiões. A energia é uma componente estratégica para qualquer Estado em especial para os principais atores da geopolítica internacional. «For the first time in generations, the United States will be an energy-dominant nation» refere o National Security Strategy of the United States of America (dezembro de 2017). Na verdade, os EUA são autónomos em termos de energia; primeiros produtores mundiais e grandes exportadores. O facto de os EUA serem uma «energy dominant nation», garante uma posição chave na estratégia dos EUA e do seu presidente, inclusive na recente disputa com o Irão, e na defesa do seu espaço vital e dos interesses geopolíticos mais gerais no atual Sistema Internacional.

Olhando para um mapa da Europa com a inscrição dos pipelines com origem na Rússia, temos uma visão da geografia energética da exportação do gás, onde se destacam os corredores de gasodutos da Gazprom para a Europa. Esta é a sua marca identitária. Estes corredores de elevada importância geoeconómica fornecem gás essencialmente, para a Alemanha, Reino Unido, Itália, Turquia, França, Polónia, Áustria, Hungria, República Checa, Holanda e Eslováquia.

O gasoduto Nord Stream 2 (entre a Rússia e a Alemanha) veio trazer a disputa geopolítica para pacata Europa, ampliar as disputas regionais, e alargar as preocupações estratégicas dos Estados Unidos ao espaço energético europeu. Em todo este processo, sobressai uma opção energética forte: a duplicação da importação de gás natural da Rússia pela Alemanha por pipeline, através do Mar Báltico, num investimento de grande amplitude. É também uma clara opção comercial alargada, onde estão envolvidas companhias alemãs, francesas, austríaca e anglo-holandesa, para além evidentemente, da sempre presente Gazprom. A consolidação deste projeto, com o alargamento da rede interna de conexão de gás, irá permitir beneficiar os países do Centro e Norte da Europa, possibilitando à Alemanha reequilibrar o seu mix energético a prazo, após a prevista redução no carvão e no nuclear. Ganha e muito a Rússia, porque permite aumentar as suas vendas de gás natural, e garante a efetivação dos contratos a médio e longo prazo, justificando os seus enormes investimentos no upstream do gás, nomeadamente no Ártico. Em oposição perdem a Ucrânia e a Polónia e países de trânsito. O jogo geopolítico e os equilíbrios energéticos estratégicos estendem-se aos EUA, que procuram também eles, ocupar o espaço do gás natural, com a sua política de exportação do Gás Natural Liquefeito (GNL) e do Shale Gas, e garantir a utilização dos muitos terminais de GNL existentes na Europa para o efeito, compensando os avultados investimentos internos, que a indústria do gás americana realizou. O Shale Gas foi a aposta dos EUA numa estratégia de exploração e exportação de gás natural. Estes detêm os meios e os conhecimentos, para potenciar e dominar o mercado do comércio mundial do gás e entrar em portas então inacessíveis, como na Europa e na Ásia-Pacífico através do GNL. Com esta tipologia de exploração, permitiu-lhe fechar muitas centrais a carvão, substituindo-as por centrais a gás de ciclo combinado, e assim reduzir as emissões de CO2. A capacidade comercial e de transporte do gás natural na condição de gás liquefeito, veio trazer ao espaço da geopolítica no campo energético global, um enorme desafio a todos os intervenientes neste processo. A utilização dos grandes espaços marítimos para transporte de gás, vem globalizar os circuitos comerciais de importação e exportação. Os mais importantes terminais existentes de GNL com capacidade de exportação situam-se no Qatar, na Austrália, Indonésia, Malásia, Nigéria e EUA, regiões e Estados que desde muito cedo atingiram o patamar mais alto das exportações. Os principais importadores de GNL situam-se na Ásia-Pacífico, com a China, Japão e a Coreia do Sul a disputarem o pódio. A UE não deixará de ser apenas, um grande importador, a par dos países asiáticos, e muito dependente destes fornecimentos.

A Rússia desenvolveu em 2014 um vasto programa, que designou de «Eastern Gas Programme», com a intenção de atingir o mercado chinês, através das reservas de gás do Leste da Sibéria, e apoiar o seu próprio mercado interno nestas regiões, e ainda expandir o GNL até ao terminal de LNG Vladivostok. Foram estabelecidas como prioridades: o complemento à rede de pipelines já existente; alargar e aproveitar os recursos estratégicos da península de Yamal, com Yamal 2 (Europe pipeline) e o Yamal LNG (da Novatek Gas and Power) – junto à cidade de Sabetta -, contribuindo para o desenvolvimento da região do Ártico, aproveitando a estratégica passagem do estreito de Bering. Trata-se de exercer o controlo das rotas marítimas de acesso aos espaços vitais e disputar os mercados globais. Assim o Nord Stream 2 (Báltico), o Turk Stream (Mar Negro) e os Power of Siberia (I e II) de ligação à China, que em 2020/21 iniciam a sua operação, em conjunto com o LNG do Ártico, são o culminar com sucesso das ambições estratégicas e de expansionismo energético montado pelo Presidente Vladimir Putin desde 2014.

O Mar Cáspio é um espaço marítimo dotado de vastos recursos naturais, principalmente de petróleo e gás natural. A Rússia, o Irão, Cazaquistão, Turquemenistão e o Azerbaijão, todos eles com fortes interesses na região disputam o domínio deste espaço. É uma região-chave para os objetivos da Rússia como potência regional e, com importância política e económica crucial para a Turquia e para o Irão. Esta região é também um corredor de exportação para China, e eixo primordial no desenvolvimento dos países vizinhos em toda a região da Ásia Central. Estes países sem exceção detêm muita riqueza energética, mas não a conseguem transportar como desejariam! A Europa deixou de ter importância estratégica nesta região. Limita-se a seguir à distância! O cenário no Mediterrâneo Oriental (Bacia do Levante) é dotado de uma geografia energética muito complexa, onde o fator conflito existe no tempo e em permanência. O foco agora é existência de grandes reservas de gás natural no espaço marítimo de Israel, do Egito e do Chipre. A quantidade de gás natural existente nestas reservas veio alterar profundamente os projetos energéticos do Estado de Israel, dada a abundância de gás natural no seu offshore e ao seu dispor. Vai garantir a Israel uma autonomia estratégia em termos energéticos que não tinha. Releva-se aqui a possibilidade de construção de um gasoduto de ligação à Europa (East Med pipeline), e as gigantes reservas de gás de Afhrodite em Chipre, Leviathan e Tamar em Israel e Zohr no Egito. Os recursos energéticos nesta zona vieram agudizar e muito os conflitos existentes entre os diversos blocos: Chipre, Grécia e Israel por um lado; noutro patamar o Egito e a Jordânia; do outro lado da «barricada», encontramse a Turquia e a República Turca de Chipre do Norte. Também aqui a UE não tem uma estratégia própria.

Quando olhamos em termos geopolíticos para o (Belt and Road Initiative), ou Rota da Seda, seja terrestre ou marítima, não temos dúvidas do que vemos: um evidente objetivo expansionista global ao nível comercial e económico da China, que inclui as áreas do circuito energético global. E claro, na forma como pretende ter cada vez mais um papel determinante na economia europeia (vejam-se os gigantescos investimentos e controlo em portos do Mediterrâneo e na própria Europa).

Conclusões

Perante uma realidade global, onde EUA, Rússia e China disputam o controlo energético mundial, a Europa deve poder olhar para a nova revolução energética e climática em curso, sem populismos e demagogias desfocadas. O European Green Deal deve ser focalizado em fazer prevalecer uma política realista, no espaço que o (pós-Brexit) vai deixar em aberto, conjugada com um efetivo e liderante combate às alterações climáticas. Contudo, se segurança energética já era uma preocupação da Europa, passou a ser uma «obrigação estratégica», em face das novas realidades do Sistema Internacional e das disputas e interesses das grandes potências globais. A UE necessita de garantir uma efetiva política de Segurança e Defesa, credível, para poder ser como ambiciona, uma Global Leader – que é o mesmo que dizer, ter voz no Sistema Internacional. Alguns instrumentos recentemente desenvolvidos nesse sentido, como a ativação da Permanent Structured Cooperation (PESCO), o European Defence Fund (EDF), e os mecanismos de base do «Investment Screening», são efetivas escolhas estratégicas, colocadas à disposição dos Estados-membros, sob a orientação da Comissão Europeia.

E de novo a nossa equação geopolítica: a obtenção de energia, a segurança energética e as medidas de controlo sobre as alterações climáticas, deverão poder proporcionar uma adequada Autonomia Estratégica à Europa, aliada à necessária Soberania Económica. E só desta equação alargada, poderá resultar efetivamente o reconhecimento a prazo da Europa, como Potência Climática, congregando os Estados membros na conceptualização de uma nova «Estratégia Energética e de Segurança para a Europa».


14 de fevereiro de 2020

Eduardo Caetano de Sousa
Vogal da Direção


[1] Nicolas Mazzucchi – «Énergie (Ressources, technologies et enjeux de pouvoir)», Armand Colin, 2017.

[2] (10 Pilares que decorrem do novo Pacto: Ambição Climática; Energia Limpa; Economia Circular, Poluição Zero; Ecossistemas e Biodiversidade; Agricultura Verde; Mobilidade; Mecanismos de Transição Justa; Investigação e Desenvolvimento e UE na vanguarda mundial (EU as a global leader).

[3] Encontra-se previsto no Plano um reforço anual de 260 mil milhões de Euros (1,5 do PIB europeu de 2018) até 2030, e 100 mil milhões de Euros para o designado Mecanismo de Transição Justa.

[4] Leonardo Maugeri – «Con Tutta L’energia possibile», Sperling & Kupfer, 2008.

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