À medida que escrevo estas breves linhas, alimento a esperança e confiança de que este novo governo possa estabelecer uma dinâmica mais ambiciosa, delineando, com urgência e precisão, uma trajetória clara e de longo prazo para Portugal. O que precisamos é de uma autêntica “Estratégia Nacional”.
Verifica-se em muitas das estratégias nacionais, conceitos e planos de Portugal, publicados até hoje, a grande frequência com que, com alguma ansiedade, se antevê a próxima chegada de fundos internacionais para desenvolvimento de projetos de âmbito nacional. Esta abordagem, predominantemente reativa e focada no curto prazo, muitas vezes se alinha mais às prioridades externas do que às genuínas necessidades portuguesas.
É crucial abordarmos questões vitais, tais como: assegurar a Portugal um papel de destaque no palco internacional, procurar antever as principais ameaças ao Interesse Nacional em todos os horizontes temporais e fortalecer, progressivamente, o Estado, instituições e sociedade para uma resposta adequada no combate a essas ameaças externas ou internas. Além disso, é imprescindível maximizar o nosso potencial, canalizando os esforços nacionais para atingir metas realistas, alinhadas com os recursos disponíveis.
Não se coloca a questão de escolha entre o nosso papel nas organizações internacionais ou de dar prioridade às questões nacionais. Não existimos em isolamento, nem nos podemos isolar, mas é-nos igualmente impossível participar plenamente, no seio das organizações e no quadro de compromissos assumidos, se a vertente nacional estiver cativa de mudanças súbitas internacionais e vulnerável a conjunturas internacionais de toda a espécie (vertente política, económica, social e securitária).
Parecemos ter alguma dificuldade em definir prioridades nacionais, com receio de com isso podermos ofender parceiros. Parecemos estar reféns de uma modéstia e humildade contraproducentes, pois um Estado não consegue defender os seus cidadãos e Interesse Nacional assumindo uma postura que indique ao exterior falta de força ou ambição. Estamos com isso apenas a demonstrar baixa autoestima ou complexos de inferioridade, que nos tornam vulneráveis a todas e quaisquer ameaças. Estamos, igualmente, a desperdiçar recursos já existentes e a pensar que precisamos de mais recursos, pois queremos abraçar o mundo e satisfazer todos, indicando a todos que nos são importantes por igual.
Será, provavelmente, por isso que “arredondamos” as frases e títulos e utilizamos palavras ou conjuntos de palavras que não nos comprometam negativamente ou possam ser interpretadas como significando termos vontades e objetivos próprios. Assim, é possível que seja a excessiva humildade a fazer-nos utilizar em conjunto palavras como “conceito” e “plano” a “estratégico”. O significado de “conceito” indica já por si a possibilidade de divergências na interpretação de algo (como prioridades e objetivos). O significado de “plano” é claro e entendido como a vertente tática e de homogeneização de procedimentos ou estruturação mais específica para atingir determinados objetivos. A “estratégia”, num sentido mais geral, macro e a longo prazo, debruça-se sobre o que se pretende atingir, os meios disponíveis e a sua integração e coordenação ou possíveis imprevistos, definindo e assumindo o resultado que se pretende.
A distinção entre uma Estratégia de Defesa Nacional (ou Conceito Estratégico) e uma “Estratégia Nacional” é notável. A primeira, parece encerrar em si uma postura vaga, reativa e defensiva a desenvolvimentos internacionais, mesmo que procure estabelecer objetivos mais gerais ou mais específicos e de curto ou médio prazos. Nesta, mesmo atentos a outras áreas ou englobando-as, não se reveem instituições que não se veem refletidas no seu título. A segunda, deveria ser um verdadeiro “pacto de regime” com envolvimento das forças vivas da sociedade, de forma a encontrar metas concretas de médio e longo prazos e em todas as áreas nacionais e internacionais (de projeção no exterior), que para Portugal representem o verdadeiro Interesse Nacional.
O sucessivo adiamento de uma “Estratégia Nacional”, assumindo uma postura de fraca ambição, levar-nos-á sempre a responder reactivamente ou pensar de forma limitada e em respostas para questões menores, evitando explorar o verdadeiro potencial de Portugal.
Esse diálogo apenas pode ser desencadeado por um governo que entenda o seu papel como gestor transitório dos interesses de Portugal e de todos os portugueses, incluindo gerações futuras, e com isso queira deixar uma herança única, realmente representando Portugal, com uma atitude proactiva para o futuro.
Sabendo que muitos portugueses também assim pensam, mantenho a esperança e a confiança de que este novo governo possa estabelecer uma postura ambiciosa, delineando, com determinação e sem demora, uma trajetória clara e de longo prazo para Portugal, adotando uma autêntica “Estratégia Nacional”.
05 de abril de 2024
António Brás Monteiro
Auditor de Defesa Nacional e Consultor de Defesa na Comissão Europeia
Este artigo de opinião foi publicado em 03 de abril de 2024 no site do jornal Diário de Notícias: https://www.dn.pt/5513259630/conceitos-planos-e-estrategias-mas-falta-a-estrategia-nacional/
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