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Segurança e Defesa: O binómio da sobrevivência num mundo instável

O Estado, ou seja, a Nação politicamente organizada tem como missão essencial procurar garantir a segurança e em última instância a defesa dos seus cidadãos.

Sem o preenchimento adequado destes requisitos fundamentais, o Estado tornar-se-á muito vulnerável ao Mundo exterior correndo o risco de a prazo desaparecer, o que ao longo da História muitas vezes já aconteceu e certamente voltará a acontecer.

A formação e a solidez da identidade nacional não é uma resultante do instinto nem surge com o local de nascimento de cada um, porquanto é algo que tem de ser ensinado, acarinhado e motivado pela Família e pela Escola desde os primeiros anos de vida dos cidadãos.

Consequentemente, terá sido erro grosseiro terminar com o Serviço Militar Obrigatório, S.M.O., reduzindo-se notoriamente o convívio social entre estratos diferenciados da população, e ainda o sentido de pertença ao Povo de onde provinham e o sentimento do cumprimento de um dever face à sociedade na preparação da sua defesa se tal viesse a ser necessário futuramente.

Todos sabemos que a promoção do facilitismo tem sempre mais apoiantes, vd. comportamento das designadas “juventudes partidárias” junto dos jovens, do que impor encargos e sacrifícios por norma mal recebidos por quem tenha de realizá-los.

É, todavia, forçoso reconhecer que nenhuma Nação cresce e progride apoiada no facilitismo, pelo que nunca é tarde procurar corrigir más decisões do passado.

Na verdade, até já haverá algum reconhecimento quanto a isto se atentarmos na criação do “Dia da Defesa para Jovens”, que é apenas um indicador mas que nada resolve quanto ao essencial da questão.

Outra questão em que com frequência claudicamos tem a ver com o planeamento que requer pensamento em antecipação, tempo, coordenação efectiva entre sectores, determinação atempada de objectivos e metas a alcançar, bem como meios e métodos a utilizar.

O obstáculo maior a ultrapassar tem a ver com uma «partidarite» exacerbada que, por norma, destrói o que existe para recomeçar de novo, sendo óbvio que este constante delapidar de recursos financeiros, materiais e humanos irão fazer falta noutras áreas funcionais da governação e atrasar irremediavelmente o desenvolvimento do País.

A agravar a situação, o Mundo onde nos inserimos é cada vez mais global e exigente em todos os sentidos, cuja complexidade nas suas diversas variantes não para de crescer e que inevitavelmente transitam em escala variável para a Governação dos Estados.

Por isso, o nosso perder tempo por sistema é ainda mais condenável e inaceitável.

Por outro lado, a preocupação de tentar organizar o Mundo através de várias instâncias internacionais não pode descurar os Estados que igualmente terão de bem organizar-se internamente ao serviço dos cidadãos e não ao contrário como, por vezes parece ser o caso.

Assim sendo, torna-se indispensável dispor de um planeamento bem entrosado entre os cidadãos e o Estado, para se alcançarem objectivos integrados e decorrentes resultados desejados para o Bem Comum.

É neste enquadramento complexo e exigente que devemos interrogar-nos se estamos preparados para enfrentarmos possíveis desastres naturais de grande monta e eventuais confrontos externos por recursos de vida escassos como, por exemplo, a água.

Em adição, será que podemos contar sempre com a defesa cooperativa haja o que houver, segundo o credo dos políticos? A realidade diz-nos que não é assim e a História já o provou suficientemente.

Mais ainda, olhando à volta, afigura-se que os principais decisores preocupam-se sobretudo com assuntos de somenos, ou mais do que secundários, não só porque são mais fáceis mas porque estão despidos de responsabilidades significativas.

Nestes termos, deveremos avaliar quem pretende conduzir-nos externamente, onde se situa o poder e aparenta exerce-lo, porquanto parlamentos de oitocentas ou mais pessoas, por exemplo, não decidem nada de útil limitando-se a empurrar com a barriga os problemas existentes na vã esperança de que o tempo os mate!

Passando agora à questão da informação, componente primária no processo da decisão acertada e em tempo oportuno, o que se tem verificado é a redução progressiva de meios próprios, nomeadamente na Instituição Militar, e a dependência crescente das organizações internacionais em que participamos.

Consequentemente, apenas saberemos o que nos quiserem transmitir e quando o entenderem fazer…

Esta é uma das mais graves fragilidades nossas, justificando plenamente a nossa atenção e análise correctiva da situação existente. Todavia, dada a natureza da matéria e responsabilidades associadas, receamos que os nossos responsáveis políticos não venham a assumir uma efectiva e bem orientada intervenção, continuando tudo na mesma.

Sendo profundas e extensas as nossas debilidades quanto à defesa e segurança, torna-se caricata a referência constante à liberdade que não existe com tais carências!

Constitucionalmente, o Presidente da República é o comandante supremo das Forças Armadas, designação que tem sido mais pomposa do que real e efectiva, aliás um resultado da sucessiva redução de poderes de vária ordem que os partidos políticos tem vindo a efectivar relativamente à Chefia do Estado.

De facto, ao que parece, o objectivo será implantar um sistema político essencialmente parlamentar centrando todo o Poder nos partidos, o que não se afigura ser a situação mais equilibrada e sensata, porquanto o Poder é sempre insaciável carecendo de “travões fortes” que evitem os excessos!

É certo que o Presidente da República dispõe de uma «Casa Militar», tal como utiliza uma «Casa Civil» para os outros assuntos, mas será que este arranjo é o mais adequado numa situação internacional muito tensa e complicada e que ira manter-se no futuro?

Bem governar é essencialmente prever e prevenir em tempo oportuno, pelo que se queremos evitar o pior deveremos imediatamente por de parte respostas do tipo «não vai acontecer-nos», «tivemos azar», «não sejamos pessimistas» e «estamos protegidos pela NATO e pela UE!».

É assim justificado lembrar que em todas as ocasiões, nomeadamente nos âmbitos da NATO e da UE, o Estado Português é o primeiro e, por vezes, o único responsável por garantir a segurança e a defesa dos seus cidadãos.

Investir na segurança e defesa não é um tema popular, pelo que se surgir uma oportunidade para mais cortes financeiros e humanos é certo e sabido que politicamente não vai ser descurada.

Assim aconteceu aquando da implosão da então União Soviética, não faltando arautos a proclamarem ter chegado a altura de beneficiarmos dos designados «dividendos da paz» com significativas reduções nos encargos com a Segurança e Defesa. Muito apropriadamente esqueceu-se que a Rússia e as suas tendências imperialistas de sempre não iriam desaparecer, verdade que se tornou visível poucos anos depois no Cáucaso, na Crimeia e na Ucrânia!

Para os Estados que dispunham de bons sistemas de forças e de meios terá feito algum sentido falar em «dividendos da paz» mas para os outros que se assemelham ao nosso caso, em que tínhamos muito pouco e assim continuamos, não faz qualquer sentido enveredar por essa via.

É que constituir sistemas de forças, armá-las e equipá-las, mesmo em escala modesta, leva anos e tem custos avultados.

Seja como for, é justa a pergunta: as poupanças que se fizeram foram para onde?

Há uma máxima muito antiga que afirma «se não queres ter guerra prepara-te para ela», ou seja, usa o factor «dissuasão» para evitares males maiores. Será que esta verdade de sempre foi considerada pelos nossos governantes? Fica a inquirição!

Desde há bastantes anos que os EUA acusam a Europa de negligenciar a sua defesa e pendurar-se no poder americano como garantia de sobrevivência, mas como tudo tem o seu termo, os EUA tem vindo a esquecerem-se da Europa e a focarem-se no polo Ásia/Pacífico com repercussões negativas para a Europa.

As relações entre governados e governantes tem de basear-se na verdade, pelo que algumas ilusões lançadas entre nós não devem prosseguir, entre elas a de que para nossa segurança basta a existência da PSP e da GNR.

Nos acontecimentos recentes ocorridos na Bélgica, Inglaterra e França, além de outros, as cidades encheram-se de militares, a tal «tropa» como muitas vezes é aqui designada com contornos displicentes para não dizer pior.

Também nas últimas décadas temos vindo a assistir a uma certa dissolução social com o esbatimento de princípios fundamentais e com a amoralização de práticas e costumes procurando fazer-nos acreditar quer o anormal é agora normal, com profundos reflexos negativos na célula básica da Sociedade que é a família.

É um facto que não estamos sozinhos nesta construção às avessas do que deve ser uma Nação, mas nós somos apenas responsáveis por nós próprios e não pelos outros, pelo que a visão do que foi a decadência de Roma, há cerca 2000 anos, não transparece com exemplo a seguir.

Se queremos progredir positivamente devemos procurar trazer para cima quem está em baixo, numa evolução com base no trabalho, no esforço e nas boas regras, criando uma mobilidade social vertical de forma natural e justa em vez de nos empenharmos em empurrar para baixo quem está em cima.

Do mesmo modo, o crime só se reduzirá significativamente entre nós quando o cidadão em sua consciência entender que não o deve cometer

Todas as reversões têm de partir do topo para a base e tanto mais quando têm de ser profundas. Assim, na situação que vivemos e que irá continuar por tempo incerto, é cada vez mais urgente efectuar uma verdadeira reforma do Estado nas suas várias componentes, aproximando os governados aos governantes sob o primado da verdade para que haja credibilidade e confiança recíproca.

Sendo uma tarefa de grande exigência, agora agravada com BREXIT, não podemos perder mais tempo em discussões inúteis e acusações que a nada conduzem.

Numa apreciação algo simplista, algumas reflexões devem ser tomadas em consideração quanto à nossa conduta externa, entre elas:

– aguardar com a serenidade desejável a evolução do «BREXIT» no contexto da UE, tendo em mente que a primazia dos interesses nacionais se sobrepõe a tudo mais;

– incrementar a nossa ligação à NATO, política e militarmente, dispondo de forças e meios credíveis o que reforçará a nossa presença política na Aliança;

– rever o Serviço Militar Obrigatório (S.M.O).;

– contribuir a todos os níveis e planos para o reforço da ligação UE/NATO, bem como quanto à ligação entre as duas margens do Atlântico;

– procurar assegurar que as nossas aquisições militares tenham componentes nacionais tanto quanto possível, mesmo que posteriores sem esquecer a cibernética e o desenvolvimento tecnológico em ligação com os centros de investigação científica universitários e outros;

– não participar em aquisições de futura utilização dispersa por vários parceiros, porquanto consumiríamos vultuosos recursos financeiros sem garantias de posse quando delas necessitássemos, no entendimento de que a N.A.E.W deve ser assumida como excepção e não como regra;

– reconhecer que a presumível capacidade militar da UE é sobretudo uma escrita de papel para cobertura política e não uma força real com que possamos contar.

Passando agora ao futuro da UE nas actuais circunstâncias, é nosso parecer que o ainda Reino Unido (R.U.) e que muito provavelmente se manterá com tal no que for fundamental, não terá pressa em consumar o «BREXIT» privilegiando o tempo para negociações que possam trazer-lhes benefícios. Consequentemente, interessa à Grã-Bretanha deixar correr o tempo para viabilizar soluções tais como:

– o regresso à UE, com ainda melhores condições das que já tinha, construindo uma roupagem política que projecte que se trata agora de algo substancialmente diferente para cobertura da face de ambas as partes, o RU e a UE;

– o esbatimento da declarada intenção de uma separação da Escócia e junção da Irlanda à sua outra parte a Norte;

– melhoria do relacionamento EUA/UE, dados os interesse recíprocos em jogo, e trabalhar no reconhecimento pelos EUA de que a «bengala» europeia lhes faz falta para o equilíbrio de forças na Ásia/Pacífico.

Nesta conjuntura, o comportamento do Estado Português deverá cingir-se exclusivamente à defesa dos nossos interesses, esquecendo pretensos «amigos» que nunca são, bem como evitar extremismos vocais que em nada nos favorecem.

A finalizar, certamente que a nossa sobrevivência depende de diversos factores, mas se a segurança e a defesa à nossa escala não estiverem suficientemente asseguradas, inevitavelmente o nosso futuro colectivo estará em grande risco.

José Lemos Ferreira
Presidente do Conselho Consultivo

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